Por Dentro do Jogo

A conta do desastre em Goiânia não é só de Domènec

O colunista Rodrigo Coutinho escreve sobre a atuação do Flamengo contra o Atlético Goianiense

A péssima e apática atuação do Flamengo na derrota para o Atlético Goianiense por 3×0, na noite desta quarta-feira, foi colocada quase que totalmente por torcedores e imprensa na conta do técnico Domènec Torrent. Mas não é bem por aí. Há uma parcela de responsabilidade do novo treinador, mas num comparativo com as partes física e anímica ela é menor. Importante frisar o grande jogo feito pelo organizado Dragão. Traçou a estratégia possível para vencer e a executou com maestria.

Foto: Alexandre Vidal/ CRF

Avaliar o desempenho de uma equipe precisa estar baseado em quatro aspectos: técnico, tático, físico e psicológico. Um ponto influencia no outro e é necessário ter discernimento e distanciamento passional para chegar mais perto do diagnóstico correto. Vamos começar então pela parte tática. Afinal, o que Torrent fez de diferente na montagem do time ontem?

Parte Tática

A equipe começou jogando num 4-3-3. Rodrigo Caio foi improvisado na lateral. Não há nada de absurdo nisso. Rafinha voltou recentemente de lesão e foi preservado. João Lucas não inspirava confiança de Jesus e segue o ”status” com Dome. Rodrigo é um zagueiro rápido e já fez a função em ocasiões pontuais no São Paulo. Gustavo Henrique e Léo Pereira formaram a zaga. O problema não foi necessariamente esse.

No meio, Arão de volante, Gerson e Everton Ribeiro como meias. Vitinho e Bruno Henrique nas pontas. Gabigol como centroavante. O esquema em si diz muito pouco sobre o modelo de jogo adotado e, a partir de ontem, já foi possível perceber conceitos de um ataque mais ”posicional” no time. A adaptação demanda tempo e treinos para que os atletas entendam a ideia. Não é do dia para a noite. Não é tão simples como muita gente tentou ”vender”.

Como as equipes iniciaram a partida.

Todos se acostumaram a ver o Flamengo se movimentar com mais liberdade no campo de ataque. Obedecia a uma ocupação de espaços prévia bem organizada, mas os atletas tinham como missão a troca de posições e a criação de espaços para serem atacados em profundidade, buscavam aproximações também para tabelas e triangulações. Isso mudou!

Vitinho bem aberto na direita. Bruno Henrique bem aberto na esquerda. Essa formatação foi vista em grande parte do 1º tempo. Everton Ribeiro e Gerson obedecendo a regiões estabelecidas no centro do campo. Gabigol mais enfiado. Laterais na ”base” da jogada. Isso não quer dizer que eles não possam se movimentar e buscar as interações entre os setores. Mas precisam fazer isso dentro de um limite. A ideia é espaçar a defesa adversária e criar naturalmente as lacunas na defesa rival promovendo uma circulação de bola eficaz.

A forma como isso é executado pode ser muito superior. Só será com sequência de trabalho e, como tudo no futebol, vontade dos atletas comprarem essa ideia. Quem executa o modelo em campo são os jogadores. Não há forma certa ou errada e jogar. Há o modelo bem ou mal executado. Os processos bem ou mal treinados.

Parte Anímica

Esta é muito importante! É natural que os jogadores do Flamengo estejam passando por um período de baixa na motivação ou relaxamento. ”Ah, mas eles ganham muito bem e o clube paga em dia, oferece estrutura, têm que atropelar todo mundo!”… Dirá com certa razão o torcedor mais passional. Mas imaginemos. A equipe ganhou basicamente tudo nos últimos meses, produziu um futebol que encantou a todos, e de repente o grande responsável por esse cenário vai embora. Qualquer ser humano precisa de um tempo de assimilação para entender os processos dessa mudança.

Por mais que não tenha uma carreira extensa como treinador, Domènec Torrent é um homem que construiu a sua vida no futebol. Ninguém chega a ser auxiliar direto de Pep Guardiola sem saber muito de bola. Acreditem! Ele não mudará suas ideias de jogo. Vai tentar executar o plano que acredita. E os jogadores precisam entender isso pra que dê certo. Jorge Jesus está no Benfica e não voltará tão cedo. Uma nova história precisa ser iniciada.

Parte Física

Uma das marcas do Flamengo nos últimos meses foi a intensidade que empregava nas partidas. Muita velocidade nas ações, agressividade com e sem a bola, muitas vezes subjugando os adversários e dando a impressão de estar num patamar de preparo físico bem diferente dos demais clubes. Isso não vem acontecendo mais. Desde as finais dos Estaduais é um time lento e travado. O período entre o fim do Carioca e o início do Brasileirão potencializou a realidade

Isso explica muito do que o time sofreu defensivamente diante do Atlético. A última linha de defesa segue jogando adiantada, mas se o homem mais próximo da bola não pressionar o adversário com energia, o passe em profundidade vai entrar nas costas da defesa a todo momento. Não há defensor rápido que anule isso. As transições defensivas baseadas no conceito de ”pressão pós-perda” também foram prejudicadas.

Parte Técnica

Com o desempenho sendo afetado diretamente nos três âmbitos citados acima, certamente a parte técnica terá um decréscimo. Mesmo assim o Flamengo produziu algumas chances de gol nos dois jogos sob o comando de Domènec Torrent. Ajustar todas essas arestas será determinante para que a confiança volte e o time passe a render o pode.

Atlético/GO

Tudo no futebol tem dois lados para ser visto. E o Dragão fez a sua parte. Na estreia de Vagner Mancini em jogos oficiais, não teve o bom ponta Matheuzinho pela direita, mas Everton Felipe o substituiu muito bem. Mais intenso e vertical que o Flamengo. Não ficou só na espreita, esperando o time carioca atacar. Tomou a iniciativa a partir de passes longos buscando a velocidade de Gustavo Ferrareis, Hyuri e Everton Felipe.

Além do trio de ataque, Nicolas e Jorginho merecem destaque pela parte técnica e personalidade que empregaram na partida. Na fase defensiva, muita compactação entre os setores no 4-1-4-1 proposto, pressão na bola a todo momento e saídas rápidas também em contragolpes. Foi um time muito competitivo!

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