Basquete

Damiris Dantas vive expectativa de disputar sexta temporada na WNBA e conta sobre dias de isolamento na bolha criada pela liga

Damiris Dantas
(Créditos: NBAE/Getty Images)

Um dos principais nomes do basquete feminino no Brasil, a ala-pivô/pivô Damiris Dantas se prepara para disputar a sexta temporada na WNBA, principal liga da modalidade no mundo. Aos 27 anos de idade, a jogadora irá vestir novamente a camisa do Minnesota Lynx, mesma equipe que defendeu em 2019.

A nova temporada da WNBA começa no próxima dia 25, e o Lynx joga no dia 26 contra o Connecticut Sun. Em videoconferência com veículos de imprensa brasileiros neste sábado (18), Damiris falou sobre a expectativa em torno do campeonato e também à respeito de ganhar mais confiança da treinadora Cheryl Reeve.

– Eu tive uma conversa muito boa com a treinadora na sexta-feira (17). Essa é minha sexta temporada na WNBA, e sempre que eu estive no Lynx havia muitas jogadoras boas ao meu lado, então eu não tinha tantas chances de participar muito ofensivamente nas partidas. A conversa foi meio nessa linha, de que eu venho me destacando mais da última temporada pra essa, e que eu assuma essa responsabilidade. Ela disse que vai colocar mais jogadas pra me ver pontuando, me ver em ação. Então acho que agora eu sou uma jogadora mais importante pro time. E o mais legal disso é que eu tenho a confiança da treinadora. Isso está me deixando mais tranquila – disse Damiris.

– O time é muito novo. Tem muitas meninas novas, o que é muito diferente do ano passado. Mas o time está muito bom, deu uma liga muito boa. A gente já percebe um entrosamento nos treinamentos. Na semana que vem a gente vai fazer alguns amistosos pra ajustar algumas coisas. Espero que a gente possa chegar nos playoffs – completou.

+ Damiris fala sobre posicionamento de atletas em lutas sociais: ‘Não vou parar enquanto não melhorar’

Assim como está acontecendo na NBA, que retorna no dia 30, a WNBA também organizou uma bolha de isolamento para as atletas na Flórida, onde são realizados os treinamentos e serão disputadas as partidas. A brasileira comentou sobre como tem sido esse período e a sensação de ter retornado aos treinamentos após esse período longe das quadras.

– As primeiras semanas foram bem complicadas porque a gente ficou em isolamento total. Eu fui pra Minnesota e fiquei quatro dias no hotel, treinando individualmente com as treinadoras. Chegando aqui na bolha, fiquei mais quatro dias em isolamento e no quinto dia tiveram alguns treinos individuais também. Logo depois iniciamos o treino coletivo. Eu estava com muita saudade de jogar basquete, de ter esse treino coletivo, claro, tomando todos os cuidados. Eu acho que a WNBA tem ido muito bem nos cuidados aqui na bolha. Foi muito bom voltar. A gente via o brilho nos olhos de cada uma. Foi uma sensação muito boa voltar depois de quase cinco meses – relatou Damiris.

Damiris Dantas em ação na última temporada (Créditos: NBAE/Getty Images)

Apesar de todo o cuidado da liga com a saúde dos envolvidos para o funcionamento da WNBA, Damiris conta que há sim um certo receio de voltar a jogar em meio à pandemia do coronavírus, mas que todos estão otimistas e com a esperança de que tudo vai ocorrer da melhor maneira possível.

– A gente tem conversado bastante. Todo mundo está muito otimista, mas sempre tem um pouquinho de medo porque não temos o controle da situação. Cada dia que a gente liga a TV é uma notícia nova, que está piorando. Aqui na Flórida tem acontecido muita coisa também. Mas a gente sendo otimista e esperando que tudo isso passe. Nós conversamos também nos bastidores sobre jogar sem torcida, que é uma coisa muito nova. Estamos otimistas e esperamos que até o fim da liga as coisas estejam melhores – contou.

Confira outros trechos da entrevista de Damiris Dantas

SITUAÇÃO DO BASQUETE FEMININO NO BRASIL

Eu já participei de quatro ligas no mundo (Brasil, Espanha, Estados Unidos e Coréia do Sul). De uns tempos pra cá, eu vi uma melhora, mas acho que a gente deu uma estacionada. Acredito que a gente precisa de mais investimentos e visibilidade. O basquete feminino está carente de todas essas coisas. Mas eu tenho conversado com as meninas e alguns dirigentes, e eu acho que agora a gente está em um caminho melhor. Ainda falta mais gente olhar, mas algumas pessoas estão olhando pro basquete feminino. Sempre tem o que melhorar. Acho que estamos no caminho certo agora.

MOVIMENTO EM PROL DO BASQUETE FEMININO E PRÓXIMO CICLO OLÍMPICO

Nós, jogadoras, temos conversado muito. A gente quer ser ouvida, a gente quer mudanças, a gente precisa de visibilidade, a gente quer que as empresas olhem diferente pra gente. Eu acho que esse é o momento da gente brigar por essa causa. Eu acredito muito que as coisas vão melhorar e que se a gente cobrar as coisas vão acontecer.

Em relação ao ciclo olímpico, eu acredito que tecnicamente o basquete feminino está em um momento muito bom. Todo mundo que tem acompanhado viu a nossa evolução e acredito que ainda podemos evoluir muito mais. Em poucos meses a gente já teve uma grande mudança. Então imagina, no próximo ciclo olímpico muita coisa vai melhorar. Se Deus quiser vai dar tudo certo.

RELAÇÃO COM JOSÉ NETO, TREINADOR DA SELEÇÃO BRASILEIRA

Graças a Deus, eu tenho uma relação muito boa com o José Neto. A gente se fala toda semana, ele se preocupa com todas as jogadoras, pra saber onde ela está, se está jogando, se está treinando, se está precisando de alguma coisa. Ele tem esse lado muito cuidadoso. É um excelente profissional. Ele trouxe muita coisa nova e boa pro basquete feminino. A evolução é nítida, estamos no caminho certo e em boas mãos. A gente não está treinando junto, mas semanalmente a gente está se falando, não só comigo, mas com todas as outras jogadoras. O melhor do Neto é que ele está sempre disposto a aprender. Ele chegou agora no feminino, mas ele pergunta, ele quer saber quem são as jogadoras, qual é o time. Ele está estudando muito pra entrar de verdade nesse mundo do basquete feminino.

SOBRE STEPHANIE SOARES, ATLETA BRASILEIRA DE 20 ANOS

A Stephanie é uma fofa. Nosso primeiro contato foi na Argentina, se não me engano. O que mais me encanta nela é que ela está disposta a aprender o tempo inteiro. Você olha e ela está te observando, querendo sugar o que for possível. Me lembra muito quando eu cheguei na Seleção e olhava pra Érica, pra Kelly…

APOIO DA WNBA NA LUTA PELA IGUALDADE SOCIAL

É muito bom. Eu me sinto acolhida, me sinto protegida. Quando você tem alguém do seu lado, quando a liga está te apoiando, você se sente com mais força e com mais vontade de falar. No Brasil, a gente tem alguns grupos com meninas de Seleção, de times, e eu conto tudo o que acontece aqui nos Estados Unidos pra elas. Esse respaldo que a gente tem da liga, uma ajudando a outra. Juntas somos mais fortes, né. Quando eu cheguei aqui bem novinha, eu acabava ficando meio perdida e sem entender muito as coisas. Agora eu tenho outro papel de estar mais atenta, de querer participar mais. É uma causa minha também. Me sinto muito acolhida e privilegiada de jogar aqui na WNBA.

MANIFESTAÇÕES DAS ATLETAS NAS PARTIDAS

Nós vamos jogar com o nome da Breonna Taylor na camisa, uma jovem que foi morta por policiais dentro do próprio apartamento. Essa semana nós vamos fazer uma reunião com a mãe da Breonna. Ela ficou muito emocionada e feliz com a homenagem. É o que eu penso. Nós atletas temos uma visibilidade muito boa. A gente tem que se posicionar, tem que falar. Aqui nos Estados Unidos, especialmente, os atletas fazem muito isso. Tenho aprendido muito e acho extremamente importante.

SER UMA VOZ ATIVA NA LUTA POR IGUALDADE SOCIAL

Eu vou continuar sempre! É a minha causa, é a minha luta. Eu não vou parar enquanto não melhorar. Eu vou estar sempre me posicionando. Eu entendi a importância do meu posicionamento, eu entendi a visibilidade que eu tenho. Eu recebo muitas mensagens. Um exemplo que eu posso falar é referente ao meu cabelo. Muitas meninas me olham e falam “putz, depois que você parou de alisar o seu cabelo, eu me senti representada e parei também e estou me reconhecendo”. Isso é muito bom. Eu estou vendo o quanto eu me posicionar é importante por conta da visibilidade que eu tenho .

COMISSÃO TÉCNICA FORMADA POR QUATRO LENDAS DA WNBA

É muito impactante quando você olha pra uma comissão formada apenas por mulheres, e só mulheres fantásticas. Me sinto muito privilegiada. São quatro grandes nomes da WNBA. A Rebekkah (Brunson), por exemplo, eu joguei com ela dois anos, se não me engano. No primeiro ano (2014) que cheguei aqui, encontrei com a Rebekkah e ela sempre me ajudou, sempre teve muita paciência comigo e eu absorvi muita coisa dela, e hoje ela está como assistente técnica. É muito bom, a gente conversa bastante. Acho que facilita um pouco quando você foi jogadora. Deu uma conexão muito boa com elas juntas. O time está muito bom, com um clima muito gostoso.

COMO LIDAR COM A APREENSÃO DE VOLTAR A JOGAR E MANTER O FOCO NAS PARTIDAS

É complicado. A gente está aqui em uma bolha, com pensamento na família. A minha família ficou toda no Brasil. Algumas meninas trouxeram familiares. Mas a liga pensou nisso também. A gente tem um trabalho toda semana com a psicóloga, em grupo ou individual. Eu, particularmente, tenho ido toda semana no trabalho individual. Eu sei que o mundo tá uma bagunça devido à pandemia, mas estar aqui, jogando, com todo esse cuidado, sabendo que a família, mesmo longe, está bem, é até melhor do que estar em casa. A liga está tomando todos os cuidados e ter esse trabalho da psicóloga tem ajudado muito.

LIÇÕES DE VIVER ESSE MOMENTO NA BOLHA DA WNBA

Estou tentando absorver tudo a todo momento. É uma situação nova pra todo mundo. Essa coisa de estar junto, o tempo inteiro, eu já estou meio que acostumada, porque no Brasil é assim. Aqui não, a gente só se encontra na quadra. Cada uma mora no seu prédio e quando tem jogo é a mesma coisa, cada uma no seu quarto do hotel. Agora é diferente. Estamos mais juntas e está sendo até melhor. A gente brinca mais, se reúne pra jogar videogame, ver um filme. Eu estou absorvendo tudo e aproveitando cada momento. Eu sei que vai ser histórico e eu não posso deixar passar nada. Está sendo muito bom ter esse tempinho a mais com as outras jogadoras, com a comissão técnica. A gente se encontra pra jogar golfe e andar de carrinho.

ROTINA NA BOLHA

Estamos treinando em um período do dia apenas. Nosso time treina no período da tarde, mas pela manhã a gente faz o teste da Covid-19, logo depois do café da manhã. Depois tem academia, almoço e descanso pra ir treinar. A organização está pedindo pra gente não ficar muito aglomerado com o pessoal dos outros times, tem sido mais com o nosso time mesmo, além de usar máscara e álcool em gel o tempo inteiro. Tem um profissional da nossa comissão que aproveita as pausas no treino pra passar álcool nas nossas mãos. Basicamente é essa a nossa rotina. Todos os dias a gente assiste vídeos de jogos com a treinadora também e a parte do tratamento.

CASO ELENA DELLE DONNE E MESMA SITUAÇÃO ACONTECENDO HIPOTETICAMENTE COM LEBRON JAMES

Eu tenho acompanhado o caso da Elena, inclusive eu vi que o Washington Mystics vai ficar do lado dela. Eu não sou médica, eu não sei quais são os problemas que ela tem de saúde. Mas, com certeza, se fosse um LeBron James, por exemplo, teria sido totalmente diferente. Ela é uma excelente jogadora, é a atual MVP da WNBA, então eu acho que as coisas vão se resolver e que seja o melhor pra ela. Espero que a liga, junto com a Elena, entre em um acerto.

(Eleita MVP e campeã da última temporada da WNBA, Elena Delle Donne sofre da “Doença de Lyme”, que afeta o sistema imunológico do portador e necessita de tratamento com remédios. Com isso, a atleta faz parte do grupo de risco da Covid-19, e solicitou dispensa da bolha. Apesar de todos os relatórios médicos e laudos apresentados, a jogadora contou, em carta aberta ao The Player’s Tribune, que o pedido foi recusado pela WNBA)

SOBRE TER PENSADO EM DAR UMA PAUSA APÓS EXPERIÊNCIA NA CORÉIA DO SUL

Eu realmente pensei em parar, mas não consegui. Eu não quis ficar em casa e resolvi seguir jogando. Eu joguei três meses na Coréia do Sul e depois a liga foi paralisada por conta do coronavírus. Fiquei mais duas semanas lá esperando se ia voltar ou não, aí acabou tudo, e eu voltei ao Brasil, ficando quatro meses. Eu não sei ainda o que vai acontecer quando acabar a WNBA. Eu tenho vontade sim de descansar um pouco e ficar em casa, porque essa rotina de jogar na WNBA e depois em outro país é muito cansativa. Eu estou com alguns problemas crônicos no tornozelo e na panturrilha que eu queria dar um tempinho pra cuidar. Não é nada que me impeça de jogar. Mas eu não sei o que vai acontecer após a WNBA.

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