Opinião

Não há mais desculpas para ajeitar o calendário do futebol brasileiro

Brenner faz valer Lei do Ex e chega ao 22º gol na temporada
Decisivo mesmo depois da ceia natalina: Brenner, do líder disparado São Paulo, comemora um de seus gols contra seu ex-time (Fluminense) na rodada deste sábado (26)

O boxing day à brasileira foi um sucesso, pelo menos do ponto de vista logístico, administrativo e financeiro. Neste sábado (26), pela primeira vez na era dos pontos corridos houve rodada entre o natal e o ano novo em sete unidades federativas, devido às alterações no calendário impostas pela pandemia do novo coronavírus (Covid-19).

Em que pese a desqualificação técnica apresentada dentro de campo em algumas das dez partidas distribuídas entre as quatro divisões do Campeonato Brasileiro, a simples realização dos jogos com interesse do público e sem problemas de atraso, organização, transmissão e afins demonstrou que o futebol nacional está preparado para adequar o calendário à agenda internacional.

Se até pouco tempo o calor de dezembro, as celebrações de fim de ano e demais tradicionalismos eram utilizados como subterfúgios para evitar a realização de jogos neste período do ano, a pandemia e sua potente demanda por adaptação provou o contrário. A chance de sanear a sequência exaustiva de jogos e proteger os clubes brasileiros de investidas irrecusáveis no decorrer da temporada, no entanto, foi descartada pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF), que já anunciou o calendário oficial para 2021, com início em 28 de fevereiro e término em 6 de dezembro de 2021, sob a coerente alegação de queda de arrecadação ¾ a receita de 2020 atravessaria o primeiro semestre de 2021, gerando uma distorção no balanço anual.

Nada que um consenso envolvendo confederações, clubes, patrocinadores, emissoras e governo federal não possa resolver. Afinal, foi em terras brasileiras que a bola voltou a rolar com mais de mil mortes diárias em decorrência do coronavírus, no último mês de agosto. A questão, de acordo com a CBF, passa pela vontade dos clubes de disputar o máximo de competições possível. Entretanto, esse suposto afã desportivo é um tiro no pé, atestado e comprovado.

Um clube europeu precisa, em média, disputar dois terços dos jogos que um clube brasileiro realiza para levantar o mesmo número de troféus. Um desconto de partidas estimado em 25% que se traduz em folgas de até 10 dias em alguns períodos da temporada no Velho Continente. Realidade praticamente impensável no calendário do futebol pentacampeão mundial.

O técnico campeão mundial e europeu sob comando do Liverpool em 2019, Jürgen Klopp, passou a temporada inteira reivindicando alterações no calendário europeu em busca de melhores condições de trabalho para si e para seus atletas. Ele só não esperava enfrentar uma equipe em condições ainda mais adversas. Os finalistas do Mundial de Clubes realizado no Catar, Flamengo e Liverpool, chegaram para a decisão, no dia 21 de dezembro de 2019, com uma diferença de 19 partidas disputadas ao longo da temporada, 53 para os Reds e 72 para o Rubro-Negro.

Em 2017, por exemplo, Flamengo, Sport e Grêmio disputaram, respectivamente, 84, 80 e 79 partidas. Os rubro-negros conquistaram os estaduais de Rio e Pernambuco, enquanto o tricolor se sagrou campeão continental, totalizando um título na temporada para cada um desses clubes. Já na temporada européia 2016/17, Manchester United (68), Real Madrid (64) e Barcelona (63) ergueram três troféus, cada. A competitividade interna de cada liga e o número de postulantes aos títulos deve ser levado em consideração, mas para além disso há a parte fisiológica do jogo.

Segundo os especialistas, um jogador de futebol profissional precisa, ao menos, de 48 horas de descanso e dieta rica em carboidratos após uma partida disputada em alta intensidade. O que nem sempre é possível na Europa, mas no calendário brasileiro é simplesmente inviável. Onde a rotina de viagens aéreas e escalas inerentes à geografia nacional, em que o território de cada estado equivale a um país europeu, incide diretamente sobre as logísticas de cada clube, prejudicando principalmente as equipes do Norte e Nordeste do país devido ao maior número de partidas realizadas no Centro-Sul.

Por fim, a economia política do futebol brasileiro tem como peças-chaves as federações estaduais, que elegem os mandatários da CBF a cada quatro anos, e possuem ao menos 16 datas no calendário, além de direitos de imagem, verba de patrocinadores e porcentagem sob a bilheteria dos jogos. Uma questão de ordem puramente política, que está diretamente ligada a quantidade de jogos disputados pelos clubes brasileiros ao fim de cada temporada.

Longe de ser simples de resolver, a questão envolvendo o calendário demanda coragem. Algo que a pandemia não nos cessa de cobrar. Sem previsão de descanso.


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