Opinião
Há um ano, o adeus a Kobe Bryant que ainda dói em todos os fãs do basquete
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O que faz um fã se apaixonar por um esporte? A torcida? A atmosfera? A história do time? Todos esses fatores são importantes, mas o principal são os ídolos, os atletas, aqueles responsáveis pelas maiores alegrias, mas também pelos momentos mais triste de um torcedor. Estes, ao lado dos torcedores, são os atores principais dessa loucura chamada esporte.
Pessoalmente, sempre fui fã de basquete, muito pela aura e mágica apresentada por Michael Jordan e aquele time fantástico do Chicago Bulls dos anos 90. Não acompanhava ao vivo, mas tudo que aquele camisa 23 aprontava em quadra, me fascinava nos vídeos e fotos dos jogos. Quem mais se aproximou da excelência apresentada pelo ‘GOAT’, foi um jovem chamado Kobe Byant. Este sim, esse jovem da Filadélfia, criado praticamente toda infância na Itália, vendo os principais jogadores dos anos 80 na Europa e fã de Oscar Schmidt, foi um dos motivos pelo qual eu me apaixonei pelo esporte da bola laranja.
Kobe era um viciado em basquete. Acordava, comia e dormia pensando em basquete. Da Itália, acompanhava através de fitas VHS o duelo histórico entre os Lakers de Magic Johnson contra os Celtics de Larry Bird. O Jovem sempre sonhou com a NBA, mas não deixou de aprender e absorver tudo que podia, vendo os melhores jogadores fora da NBA, como Oscar Schmidt, muito de perto e agregando tudo que podia ao seu jogo.
Bryant era um predestinado ao sucesso e antes mesmo de completar 18 anos, Kobe já estava sendo escolhido no draft de 1996 pelo Charlotte Hornets mas trocado para a franquia ao qual era apaixonado graças a Magic Johnson, o Los Angeles Lakers. Ainda com a camisa 8, o jovem encontrou no time uma estrela em ascensão na liga, Shaquille O’Neal. Além do pivô dominante, Bryant precisaria lidar com as grandes estrelas do esporte e principalmente seu maior ídolo, Michael Jordan, que ainda estava na ativa e era da mesma posição dele.
Mas como disse anteriormente, Kobe estava predestinado ao sucesso e a causar impacto desde a sua chegada à NBA. Os primeiros anos na Liga foram de muito aprendizado mas sempre com muita personalidade, que era uma característica marcante de Bryant. Até aquele momento, o mundo do esporte ainda não conhecia a mentalidade Mamba, o que seria a marca mais forte da carreira do jogador. Mas vou abordar isto mais a frente.
A consagração definitiva de Kobe veio sob a batuta do treinador Phil Jackson e ao lado de Shaq, formando uma dupla que assombraria a NBA e devolveria os Lakers ao topo mais alto do pódio nas temporadas de 1999-2000 a 2001-2002. O último time a enfileirar três títulos em sequência, havia sido os Bulls, do grande ídolo Michael Jordan. Coincidência? Não para quem sempre acompanhou a carreira de Bryant e sua fixação em superar o mentor. Este, inclusive, é um ponto a se destacar. Já em reta final da carreira, Jordan, mesmo sendo adversário, sempre tratou Kobe como um irmão mais novo e seu sucessor no comando da Liga.
E para todo torcedor, como Jordan virou após a aposentadoria, a Liga tinha ficado nas mãos da pessoa certa para mantê-la no topo. Kobe era a personificação que talento sem ética e empenho, é apenas talento. Que o trabalho duro, dedicação e foco otimizam o atleta. E por todas histórias contadas e ‘lendas’ criadas ao longo dos anos, nada se compara ao que Bryant entregou durante toda a carreira.
Apesar do três títulos em sua parceria com Shaq, Kobe Bryant ainda vivia a sombra do companheiro de equipe e não era considerada a estrela da companhia como merecia. Houve um hiato entre 2002 e 2009 até a próxima conquista. E o que o camisa, agora 24, aprontou nesse período, assombrou a todos e particularmente a mim como fã de esporte.
O ápice das atuações individuais veio na temporada 2005-2006. Com um elenco abaixo do que a história dos Lakers estava acostumada, Kobe assumiu as rédeas do time com média de 35.4 pontos por partida e uma atuação que apenas perde para Will Chamberlain na pontuação individual na história da Liga.
Em 22 de janeiro de 2006, Kobe tinha pela frente o Toronto Raptors, no Staples Center, em um jogo de meio de temporada. Como de costume, o primeiro mês do ano tem como foco principal da sociedade americana a NFL e iminência do Super Bowl. Mas Bryant fez com que todos olhassem para Los Angeles naquele domingo. Com uma atuação somente superada em números por Will Chamberlain, o camisa 24 anotou 81 pontos, ficando atrás do recorde de 100 da NBA.
O feito era apenas mais um dentro de uma carreira que chegaria bem perto de rivalizar com Michael Jordan. Na temporada de 2008-2009 veio a chance que Kobe queria para eternizar seu nome no olimpo dos ídolos dos Lakers. Particularmente, ali foi um dos momentos em que mais consegui acompanhar e me encantar com o talento do camisa 24. Ao decorrer dos jogos, a equipe de Los Angeles mostrou que seria um dos candidatos ao título e Bryant ao MVP da Liga.
Após dominar no Oeste, Kobe tinha pela frente nas finais da NBA o maior rival dos Lakers na história: Boston Celtics. A equipe adversária tinha um quarteto poderoso com Rondo, Ray Allen, Paul Pierce e Garnett. Bryant tinha ao seu lado Pau Gasol e Lamar Odom como ajudantes. A final seria uma revanche da temporada anterior, onde o time celta se sagrou campeão.
A derrota parece ter sido um combustível para Kobe e o camisa 24 dominou os jogos e finalmente pode ser o protagonista que sempre quis ser liderando os Lakers ao título após sete épicas partidas. Na temporada seguinte, 2009-2010, Bryant conquistou o quinto e último anel de campeão na sua carreira. E que senhora carreira ele tinha desenhado até ali.
Aos 35 anos, Kobe ainda mostrava a mesma gana e vontade de vencer apresentada em toda carreira. Mas o corpo, que tanto foi levado ao limite por Bryant, começou a traí-lo. A partir de 2013, o camisa 24 precisou conviver com lesões recorrentes, uma mais grave do que a outra, até a mais grave de todas, em 2014, ao romper o tendão de aquiles. Talvez a lesão mais temida para os jogadores da NBA. Com 36 anos, todos pensavam que ali seria o fim da linha para o craque das quadras.
Mas por tudo apresentado nos quase 20 anos de carreira, Kobe não merecia se despedir do esporte ao qual tanto amou e tanto entregou sem ser deixando a última gota de suor em quadra. Bryant voltou as quadras na temporada 2015-2016 avisando ao mundo do basquete que aquela seria a derradeira. Com o físico limitado, pela idade e pelas lesões, ele atuou em 66 jogos, limitados a 28 minutos por partida, os menores números desde o primeiro ano na NBA.
Sem o mesmo vigor físico, Kobe ainda apresentava a mesma técnica e talento empregado durante todas as 20 temporadas nos Lakers, mas tudo que se via em quadra era um atleta relutante em deixar aquilo que foi a sua vida até ali. Mas em um roteiro digno de filme de Hollywood, que por acaso, foi a casa do camisa 24 durante toda a carreira na NBA, o último adeus foi ao melhor estilo.
E este jogo até os dias de hoje me arrepia de uma forma que somente poucos momentos do esporte puderam me proporcionar. Era uma quarta-feira, 13 de abril de 2016. Chegava eu cansado após um plantão exaustivo, quase desistindo de assistir o adeus de um dos meus maiores ídolos do esporte. Mas algo dentro de mim me dizia que eu me arrependeria de não acompanhar a última partida do camisa 24.
Meu instinto estava correto. Diante de um Staples Center lotado, de torcedores, celebridades de todos os tipos, Kobe estava pronto para deixar tudo que tinha pela última vez em quadra. O físico não era mais o mesmo, mas o talento, a garra e a disposição era a mesma que vi durante toda a carreira. Arremessando tudo que podia, Bryant foi pontuando como sempre e todo time girava em torno de sua estrela maior.
Em meados do terceiro quarto, olhei estatísticas dele no site da NBA e percebi que algo extraordinário estava por vir. E de fato, por uma última vez, ele assombrou a Liga que tanto o idolatrou e o admirou. Kobe colocou o time nas costas e acabou com a defesa do Utah Jazz. Aos 38, Bryant atingiu 60 pontos, em uma atuação que só ele mesmo poderia acreditar e entregar em seu último jogo. Para qualquer amante da bola laranja, o Staples Center era o lugar onde todos queriam estar. Ou pelo menos deveriam estar assistindo aquele último show de um mágico das quadras.
Confesso que nos últimos arremessos de Kobe, eu me animei, mas ao mesmo tempo constatei que seriam os últimos que veria. Era um misto de arrepios com uma nostalgia de alguém ao qual pareceria os momentos mágicos que aquele garoto da Filadélfia tanto entregou e tanto me fascinou. Sua saída de quadra, antes do final da partida e ovação por todos os presente, me levou as lágrimas. Lágrimas de agradecimento, de alegria por ter visto uma lenda do esporte que tanto amo se despedindo.
Eu me senti no dever de aplaudí-lo e reverenciá-lo por tudo que fez pelo basquete e o tanto que me fez admirá-lo dentro de quadra. Naquele 13 de abril de 2016, pensei que seria a última vez que Kobe Bryant me faria chorar e me arrepiar na vida.
Mas quis o destino que a próxima vez que uma notícia de Kobe Bryant me arrepiaria, seria da pior maneira possível. Na tarde do dia 26 de janeiro de 2020, vejo relatos no Twitter sobre a queda de um helicóptero em Calabasas, na Califórnia, levando ao óbito todos os nove ocupantes. Alguns diziam que Kobe e sua filha Gianna eram dois dos passageiros daquele voo. O arrepio foi instantâneo, e a busca incessante em confirmar aquele noticia era frenética.
Os arrepios e a angústia faziam parecer que a perda era de um familiar próximo, de um ídolo que fez parte de toda minha infância que eu tanto admirei. Até que a noticia de fato veio e o baque foi inevitável. Aquele garoto da Filadélfia que fez um torcedor do Chicago Bulls torcer pelos Lakers e tanto se encantar com ele, nos deixava em um acidente trágico. O sentimento era algo indescritível.
Kobe Bryant não foi apenas uma figura central do basquete. Kobe era uma ícone cultural do basquete, tal qual Michael Jordan, seu mentor e ídolo, foi para o esporte. As controvérsias na vida pessoal nunca diminuíram o tamanho dos feitos dele em quadra. Kobe era um atleta ímpar. Era um atleta que brigava nas discussões de melhor de todos os tempos em todas as modalidades. Kobe era mágico. Kobe foi luz. Kobe foi único. Kobe foi Kobe.
Como um fã e torcedor, tudo que posso dizer neste dia 26 de janeiro de 2021, onde a partida de Kobe completa um ano é parafrasear o que o próprio disse em seu documentário vencedor do Oscar sobre o basquete: Muito obrigado por tudo. Muito obrigado basquete. Mas muito, muito obrigado mesmo, Kobe, por tudo que você foi para esse esporte.
Mamba out. (Mamba fora)
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