Futebol Internacional

Vinicius Júnior: O Poder da Ambição

Como Vinicius Júnior superou o racismo e a perseguição para tornar-se o melhor do mundo?

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Foto: Denis Doyle/Getty Images
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Entre críticas, polêmicas, recordes e títulos, Vinicius Júnior é um dos principais jogadores do planeta há algum tempo, queira você ou não. O brasileiro é um dos favoritos para vencer a premiação da Bola de Ouro nesta segunda-feira (28). Por isso, eu convido a todos a passear brevemente pela história que o nosso Vini construiu ao longo destes 6 anos na Europa.

No dia 23/05/2017, o Real Madrid anunciou acordo com o Flamengo para comprar Vinicius Júnior, de apenas 16 anos, por 45 milhões de euros, cerca de 164 milhões de reais na cotação da época. O jovem embarcaria rumo à Espanha no ano seguinte, em julho de 2018, um dia após completar 18 anos. A ideia da diretoria merengue era que Vinicius treinasse com o elenco principal e disputasse partidas pelo Real Castilla, a equipe B do clube, até porque o Real acabava de anunciar a chegada de um tal de Eden Hazard, contratado a peso de ouro para vestir a lendária camisa 7.

Vinicius estreou profissionalmente pelo Real Madrid no dia 29/09/2018, em um clássico contra o Atlético de Madrid pela La Liga, e já quebrou o primeiro recorde ao tornar-se o primeiro jogador nascido nos anos 2000 a estrear pelo clube. O primeiro gol sairia um pouco mais de um mês depois, mas Vini já acumulava boas partidas e se mostrava muito participativo sempre que entrava. Apesar disso, era alvo constante de críticas exacerbadas, e não seria um exagero afirmar que o ponta era vítima de uma perseguição interminável. A verdade, porém, é que essa má vontade da imprensa esportiva e dos torcedores com Vini Jr. aflorou ainda no Brasil, enquanto o garoto dava os primeiros passos no profissional. É difícil até hoje cravar o motivo de tanta desconfiança e desprezo por ele. Sim, Vini não possuía uma finalização refinada, e perdia muitas chances de gol, mas nada que não pudesse ser trabalhado por um jogador de 18 anos. Talvez fosse resultado do clubismo cultivado no nosso país, que se recusava a ver um cria do Flamengo brilhando na Europa. Outros motivos infelizes (que conhecemos bem) não podem ser descartados, não é mesmo? Como um moleque preto, da periferia de São Gonçalo, acreditava que era capaz de ser protagonista do maior clube do mundo?

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Reprodução/X

Foram meses sendo contestado pelos brasileiros, além de alguns europeus frustrados. Vinicius lidou com as críticas com muita maturidade e profissionalismo, e pouco a pouco foi elevando o nível como jogador. Ele trabalhou em silêncio e respondeu em campo, com toda a mágoa acumulada por aqueles que outrora o ridicularizavam. O jogo da virada de chave foi em abril de 2021, em uma vitória de 3 a 1 sobre o Liverpool, quando Vinicius marcou dois gols e tornou-se o jogador mais jovem a registrar um doblete pelo Real Madrid em uma partida de Champions League. Naquele dia, o jovem mostrou ao mundo que poderia sim ser protagonista. Faltava, porém, uma grande conquista para chamar de sua, e a consagração veio na temporada seguinte, quando Vini, ao lado de Benzema, carregou o Real para a conquista da Champions 21/22. Os deuses do futebol não poderiam ter reservado um roteiro mais belo para a final naquele 28/05, quando contra o mesmo Liverpool, Vinicius Júnior completou cruzamento de Valverde para marcar o gol do título na maior competição de clubes do planeta.

Após a consagração, os rivais do Real na Espanha recorreram à mais baixa tática para frear Vinicius: o racismo descarado. Em um país com um histórico expressivo de racismo contra jogadores negros, muitos destes criminosos pensaram que as ofensas seriam o suficiente para impedir a continuidade do sucesso estrondoso do garoto. Acharam que ele abaixaria a cabeça. Pois bem, acharam errado. Vinicius enfrentou o tabu que pairava sobre o futebol espanhol e espalhou as denúncias nas redes sociais, para que o mundo todo visse o que estava acontecendo. Um estádio inteiro chamou Vinicius de “macaco”, e o Valencia, clube mandante daquela partida, teve a coragem de questionar as acusações. Para completar a vergonha, o presidente da La Liga, Javier Tebas, alegou que o craque exagerava nas críticas à forma como a liga espanhola tratava dos casos de racismo (spoiler: negligência e descaso). A partir deste episódio, Vinicius Júnior transcendeu ao futebol e tornou-se um símbolo na luta antirracista. Ele estará pra sempre marcado na história como o jogador que quebrou a espiral do silêncio e levantou-se contra o racismo no futebol espanhol.

Toda esta saga só serviu para dar mais ambição para Vinicius, que seguiu encantando ao mundo com gols, assistências e grandes atuações (principalmente em noites europeias). Em 2023, o Real ficou pelo caminho na semifinal na Champions, com campanha brilhante de Vini, que herdaria a camisa 7 de Hazard ao fim da temporada. Em 2024, porém, a cada grande jogo que ele fazia no mata-mata europeu, mais crescia o burburinho em torno de uma possível conquista da Bola de Ouro. Será possível? A esperança foi crescendo à medida que o Real avançava, até que chegaram em mais uma final, desta vez contra o Borussia Dortmund. Coube a Vinicius marcar o segundo gol da partida para selar mais um título continental para os merengues, o décimo quinto da história do clube. Ele era rei na Europa, um bicampeão da Champions, com gols nas duas finais, incontestável. O que falta? Veio então a tão esperada indicação: Vinicius Júnior será finalista da Bola de Ouro! O moleque viveria o que é considerado por muitos como o ápice para um jogador de futebol.

Para um país que anda tão desesperançoso com o futebol como o Brasil, com tantos fracassos seguidos, Vinicius é como uma luz no fim do túnel. Teria chegado a hora de voltarmos ao topo? Um brasileiro não chega à mais valiosa prateleira do futebol mundial desde 2007, quando Kaká foi o melhor jogador do mundo pelo Milan. Caberia a este moleque de São Gonçalo nos colocar nos holofotes novamente? É isso que vamos descobrir na premiação da France Football, dia 28 de outubro. Isto mesmo, dia 28! Talvez estejamos diante de mais um dos belos roteiros que esta vida prepara para nós. Quis o destino que o dia da entrega da Bola de Ouro caísse no dia 28, o mesmo número presente nas costas da camisa que Vinicius vestira para estrear pelo maior clube do mundo. E para os mais íntimos, a data marca o Dia do Flamenguista, o dia do padroeiro do clube. São Judas Tadeu, rogai por nós!

Se fosse mandar um recado para aqueles que ainda não se renderam à alegria e ao talento do melhor do mundo, com 92 gols, 64 assistências e 12 títulos pelo Real Madrid, eu só teria a lamentar. Mesmo que você não admire o que ele faz dentro de campo, há de se concordar que Vini é um exemplo de superação e do poder da ambição. Julguem-me, se pareço ter me perdido na imaginação ao escrever esta crônica, pois esta, na verdade, foi uma carta de agradecimento à Vinicius José Paixão de Oliveira Júnior.

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