“Be like Mike” foi o “American Way of Life” dos anos 90

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Publicado em 25 de junho de 2020, às 12h14

O maior, e melhor, jogador de basquete de todos os tempos. Não há adjetivo que seja mais justo com Michael Jordan. Seis vezes campeão da NBA, cinco vezes melhor jogador da temporada regular, calouro do ano de 1985, dez vezes maior cestinha da temporada e melhor jogador defensivo em 1988. No entanto, acredite se quiser: o maior feito da carreira de MJ não foi dentro de uma quadra.

A Guerra Fria tinha acabado fazia pouco mais de seis meses com a dissolução da União Soviética. A Olimpíada de Barcelona, em julho de 1992, seria a primeira vez em que os Estados Unidos seriam colocados à prova sem seu maior rival no cangote. Era preciso fazer bonito. O Comitê Olímpico Internacional deu uma ajuda, liberando pela primeira vez a participação de atletas profissionais na competição. A decisão era fácil: mandar Michael Jordan para a Espanha e expandir o estilo de vida americano. Era hora de investir de vez no “soft power” e tentar recuperar a força do tão famoso “American Way of Life”.

A ação foi coordenada em muitas frentes. O basquete era apenas um meio, mas o objetivo era muito maior. Ao mesmo tempo era produzido pela marca Gatorade o comercial “Be Like Mike¹”, uma das maiores peças publicitárias de todos os tempos. A Nike lançava o Air Jordan VII, tênis que Michael Jordan usaria durante a competição. A mídia americana, por sua vez, tratava de elevar os adversários da lenda na competição – Oscar Schmidt (Brasil), Toni Kukoc (Croácia) e Arvydas Sabonis (Lituânia).

O Dream Team de basquete americano (focado em Michael Jordan) representava vários dos mitos norte-americanos como a igualdade racial, a ascensão financeira por meio do trabalho duro e principalmente a liberdade de escolha/expressão. “Ser como Mike” representava ser livre – em uma completa comparação ao conceito ditatorial que os americanos empunhavam na ex-inimiga União Soviética. Jordan era um deus que passeava pelas quadras diante de meros humanos. E era assim que os Estados Unidos precisavam ser vistos nos anos 90: como uma entidade superior.

O DINHEIRO MANDA

O sucesso da estratégia é inegável. Em menos de dois anos a China já transmitia a NBA² e em quatro anos a liga de basquete norte-americana já era transmitida para tantos países asiáticos quanto a Champions League. No entanto, a maior vitória estado-unidense não foi no esporte, mas sim no campo econômico.

Os EUA tiveram inúmeros motivos para aumentar em 148% seu PIB na década de 90³. O conhecido “90’s Boom”, no entanto, é medido mais do que em notas de cem dólares. É cultural. E o Dream Team é um dos principais alicerces dessa expansão cultural. Michael Jordan não é só o maior jogador de basquete de todos os tempos, é provavelmente o maior garoto-propaganda da história do esporte.

“Be like Mike” ganhou força e virou um estilo de vida. Não à toa, a série “The Last Dance” (produzida pela ESPN americana e veiculada no Brasil pela Netflix), que contou os bastidores do último ano de carreira de Jordan, atingiu mais de 24 milhões de domicílios ainda em maio. Nos anos 90, se fôssemos reimaginar a famosa imagem yankee “I WANT YOU”, ela fatalmente seria estrelada por Michael Jordan.

CURIOSIDADE BÔNUS

O comercial “Be Like Mike” do Gatorade quase não teve essa música. Segundo revelou o cantor Ira Antelis, a peça seria feita apenas com lances de Michael Jordan jogando pelo Chicago Bulls com a música “I wanna be like you”, escrita para o filme Mogli (1967), da Disney. No entanto, a canção no filme é cantada por um orangotango e os executivos resolveram mudá-la para não serem acusados de racismo.