Cafu? Que nada. Ao entrar nas páginas de torcedores do La Serena, clube da primeira divisão do Chile, é fácil notar a preferência por outro brasileiro. Trata-se de Rômulo Zanre Zwarg, polivalente jogador de 21 anos. O atleta, que ganhou notoriedade no futebol de base do Brasil atuando pelo Cruzeiro como volante, agora faz sucesso no futebol chileno como lateral-direito. E a nacionalidade do brasileiro leva a apelidos ainda mais ousados.
– Cafu, Romulodinho…Pelo jeito as pessoas estão gostando! Isso me motiva ainda mais para eu entrar em campo e dar o meu melhor. Fico grato, porque eu não sabia que conseguia passar essa imagem para as pessoas, como lateral. Quero seguir assim, para continuar recebendo os apelidos. Seguir melhorando e mostrando que eu posso ainda mais – disse Rômulo, em entrevista ao Esporte News Mundo.
Rômulo fez parte do time sub-20 da Raposa que fez boas campanhas em 2019. Ao lado de Adriano, Maurício, Matheus Pereira e companhia, chegou às quartas-de-final da Copa São Paulo 2019, perdendo apenas nos pênaltis para o São Paulo, campeão naquela edição. No mesmo ano, foi à final da Copa do Brasil da categoria diante do Palmeiras de Wesley, Patrick de Paula e Gabriel Veron. Também acabou derrotado nas penalidades. No fim de 2019, com a queda do Cruzeiro para a Série B e o clube mergulhado em crise, Rômulo deixou a Toca da Raposa. Mas a vontade era outra:
– Naquele momento, para ser bem sincero, eu queria continuar. Até porque eu estava sendo chamado várias vezes para treinar no profissional e estava me saindo muito bem. Eu cheguei a comentar com várias pessoas sobre o meu interesse, sobre a minha vontade de querer ficar e jogar. Mas, naquela época, igual foi dito, o clube estava mal financeiramente, teve a mudança de diretoria. Então, não tive muito o que fazer. Infelizmente o futebol é assim e eu tive que seguir outro rumo. Mas se por um acaso tivesse que voltar, voltaria para o Cruzeiro sem dúvida alguma.
DEPRESSÃO COMO ADVERSÁRIO
Chegado o limite da idade para o sub-20 e diante do caos no Cruzeiro, momento em que vários jogadores deixaram a base do clube, Rômulo partiu para o futebol chileno, no início de 2020. Mas antes de conquistar apelidos e idolatria na cidade de La Serena, o começo foi difícil.
– Para falar a verdade, quando eu vim para cá, eu demorei para me adaptar. Tive um início de depressão e isso acabou me afetando bastante. Minha vontade era largar tudo. Cheguei aqui em fevereiro, com uma vontade imensa e do nada, começou a pandemia. Fiquei preso em casa, sem falar com ninguém. Afetou a mim e a muitas pessoas. Ainda mais eu, sozinho aqui, sem falar idioma, sem saber cultura, sem saber me virar direto. Isso me pegou muito rápido e conseguiu me deixar para baixo de uma forma que eu ainda não conhecia. Não conseguia me abrir com meus companheiros sobre isso, não conseguia falar. Mas dá para perceber na pessoa, quando ela tá mal – conta o jogador.
Inspirado por personalidades como Simone Biles e Naomi Osaka, que também sofrem com depressão e falam abertamente sobre a doença, Rômulo trata o assunto com serenidade.
– Esporte, futebol, não dependem apenas do físico da gente. Depende muito da nossa cabeça, também. Se a cabeça não está boa, o corpo não corresponde. A depressão é uma doença silenciosa. Eu li que muitos atletas têm isso, mas não sabem. Isso aí atrapalha muito o desempenho – aleta.
ASCENÇÃO NO CAMPEONATO CHILENO
Depois de alguns meses afastados do futebol para recuperar a mente, o Rômulo superou a doença com o apoio dos companheiros e da namorada, que foi se mudou e hoje vive com jogador no Chile. O retorno aos campos em 2021 coincidiu com a chegada do técnico Miguel Ponce ao Deportivo La Serena. O ex-defensor, com a experiência de ter jogado por uma década na seleção chilena, passou a utilizar Rômulo como lateral-direito, posição em que o atleta havia atuado pontualmente na base.
Na atual temporada, o brasileiro foi eleito duas vezes para a seleção da rodada da liga chilena, escolhida pela página especializada “Prensa Fútbol” e se afirmou como uns destaques do país na posição.
– A partir dali, eu comecei a mostrar meu potencial e a me destacar. Fui me destacando, entrando em seleção da rodada, e me senti contente demais com isso por tudo que eu passei ano passado. Espero seguir assim até o final do torneio. Acho que estou crescendo bastante. Estão me notando mais, mas para mim está só começando. Eu quero gravar meu nome, quero que saibam quem eu sou e quero fazer meu nome circular, tanto por aqui, como pelo Brasil. Minha vontade mesmo é de voltar para o Brasil – não esconde o atleta.
ENCARADA EM LENDA DO FUTEBOL CHILENO: “JOGOU ONDE?”
No La Serena, Rômulo é companheiro de duas lenda da seleção chilena: Matías Fernandez, campeão da Copa América em 2015, e Humberto Suazo, nono maior artilheiro da história de “La Roja”. O repertório do centroavante inclui um golaço de cobertura sobre o Brasil, na Copa América de 2007. Mas a pouca idade de Rômulo o levou a uma situação inusitada:
– Eu não conhecia ele. Então, no primeiro treino dele aqui, ele pediu para eu jogar para frente e eu discuti com ele. Falei, “po, tá chegando agora, já quer falar comigo desse jeito, quem é você…”. Depois que eu fui pesquisar, saber a história dele. E aí eu fui saber o tamanho da encrenca que eu tava criando (risos). No outro o dia eu já tinha na minha cabeça que eu ia me desculpar. Mas começou o treino, fizemos uma boa jogada que deu em gol e ele veio me pedir desculpa, o que nem era dever dele. Admiro muito ele por causa disso, por essa humildade que ele tem e pelos gols, claro.
Com um carinho especial pelo Cruzeiro, mas desejo de jogar por qualquer equipe grande do Brasil, Rômulo apresenta suas melhores qualidades.
– Meus lançamentos, minha velocidade e minha força para marcar. Minha marcação acho que é um dos meus pontos mais fortes. Minha velocidade, também, é um dos pontos que eu mais evoluí aqui, em relação a jogar mais rápido. Como o futebol aqui é mais intenso, precisei me adaptar à forma como eles jogam, intensidade os 90 minutos. Tive que aprender a pensar mais rápido – descreve o jogador, que reforça o caráter competitivo do futebol chileno:
– Não acho que o campeonato seja fraco. Acho que o campeonato aqui é muito competitivo, intenso. Antes de eu vir, me falavam: “O campeonato chileno é fraco…”. Eu não achei. Para mim, aqui é muito mais intenso do Brasil. Mas é aquilo, no Brasil eles conseguem definir melhor as jogadas, aqui falta um pouco mais.
Apesar do desejo de se provar no futebol brasileiro, o jovem garante foco no La Serena, atual 12º colocado de 17 equipes que disputam a primeira divisão.
– Por enquanto, minha cabeça está só aqui. Porque aqui eu dei meu primeiro passo no profissional, aqui eu estou começando a crescer. Então eu não quero dispersar minha cabeça ou ficar com esperança que eu vá para algum lado. Quero focar aqui, dar meu melhor aqui, que eu tenho certeza que dando meu melhor aqui, posso ser reconhecido por alguém, por algum clube da Europa ou do Brasil.
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