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#Maraca70ENM: A queda da grade que entrou para história do Maracanã

Foto: Reprodução

Dentre as muitas festas durante todos 70 anos, o Maracanã já vivenciou uma tragédia. Antes de a bola rolar para a final do Campeonato Brasileiro de 1992 entre Flamengo e Botafogo, os torcedores – lógico que eufóricos – esperavam ansiosamente pela partida. Aproximadamente 30 minutos para o apito inicial, uma das grades de proteção da arquibancada destinada a rubro-negros desabou, causando a queda de vários torcedores. O caso deixou três mortos e 82 feridos. A tragédia entrou, infelizmente, para a história e já faz 28 anos.

Caos instalado. O rompimento de quase 13 metros de grade no primeiro degrau da arquibancada fez com que torcedores do Flamengo despencassem quase 8 metros em cima das cadeiras, que também estavam lotadas. Minutos depois, o jogo aconteceu. O empate por 2 a 2 confirmou o título brasileiro do Flamengo, que já tinha vencido por 3 a 0 no jogo de ida. 

O laudo da perícia – concluído por técnicos do Instituto Criminalista Carlos Éboli dias depois da tragédia – apontou uma série de falhas. As grades da arquibancada estavam mal instaladas, havia peças corroídas pela oxidação, além de uma superlotação de torcedores.

Dias depois do ocorrido, o presidente da Suderj, Márcio Braga, anunciou a interdição do Maracanã. Com isso, o Campeonato Carioca, disputado no segundo semestre, teve a realização dos clássicos em São Januário. O Esporte News Mundo entrou em contato com Márcio Braga, mas ele preferiu não comentar o assunto por conta das más lembranças.

O Flamengo mandou boa parte de suas partidas na Gávea, enquanto o Vasco manteve a Colina como casa em todos os clássicos. Já o Botafogo contou com o Caio Martins e o Fluminense recebeu suas partidas nas Laranjeiras. O retorno do Maracanã aconteceu apenas em 3 de fevereiro de 1993, em um amistoso no qual o Flamengo bateu o Cruzeiro por 2 a 0.

JÚNIOR: “SE A GENTE TIVESSE VISTO A CENA, DIFICILMENTE TERÍAMOS CONDIÇÕES DE JOGAR”

Foto: Reprodução

 O lateral-esquerdo na época, Júnior, estava partida e foi autor do primeiro gol do Flamengo. Em entrevista ao Esporte News Mundo, ex-jogador e hoje comentarista dos canais Globo comentou o momento antes, durante e após a queda da grade.

– Naquela situação, a gente já estava fazendo o aquecimento na sala do vestiário e eu estava na porta, quando eu vi o nosso preparador físico, o Euvécio, que entrou no gramado e parecia que estava chovendo e ele iria ver qual o tipo de chuteira a gente poderia usar. Quando eu vi ele entrando, senti que alguma coisa aconteceu, mas a gente não viu e nem escutou nada… Quando ele voltou, eu perguntei: “o que aconteceu?” Imediatamente, puxou eu e Gilmar e disse que tinha despencado a arquibancada do lado do Flamengo. Falei para ele não dizer nada para ninguém até para que ninguém ficasse assustado e aguardamos a decisão se ia ou não ter jogo.

Ídolo do Flamengo fez questão de ressaltar que caso os jogadores tivessem visto a cena, a partida poderia não acontecer por conta do susto que tomariam. Porém, como era capitão da equipe, incentivou o time a focar na partida.

– Quando a gente voltou para o vestiário, eles foram obrigados a falar para todo mundo o que tinha acontecido. O treinador Carlinhos fez a preleção, aí eu falei: “pessoal, se a gente tivesse visto a cena, dificilmente teríamos a condição de jogar, mas como não vimos, vamos para o jogo”. Era para dar alegria a todos que estavam lá no estádio – destacou.

Apesar dos transtornos iniciais, Júnior finalizou ao dizer ao longo do duelo os ânimos foram se acalmando e os jogadores focando no que realmente importava: o título de campeão brasileiro.

– Se a gente tivesse fazendo aquecimento dentro do campo e tivesse visto a imagem, que vimos pela televisão depois, eu não sei se teríamos condições de jogar, porque realmente foi chocante. A cena é difícil de digerir. Depois que o jogo começou, a adrenalina por parte da torcida vai abaixando, talvez tenham começado mais baixo na questão de gritos, incentivo. Do outro lado, a torcida adversária até desdenhou da situação. Da metade do jogo para frente, ela começou a viver o momento e terminou como se tivesse sido um jogo normal.

CARLOS ALBERTO DIAS: “O CLIMA FICOU MUITO TENSO! FICAMOS UM BOM TEMPO PARADOS EM CAMPO”

Foto: Reprodução

Carlos Alberto Dias, após se destacar como campeão paranaense pelo Coritiba, estreou-se no Botafogo no dia 11 de fevereiro de 1990, na vitória de 2 a 0 sobre o Fluminense pelo campeonato carioca, com gols de Donizete e Gustavo. O meia atuou em 97 jogos e marcou 21 gols pelo Botafogo. Em conversa com o Esporte News Mundo, ele relatou momentos de apreensão:

– Não ficamos sabendo de nada não somente após a entrada no campo. Até porque nós estávamos no vestiário e lógico que houve um som muito alto, mas a gente pensou que era torcida. – disse.

Carlos Alberto Dias relatou que os jogadores ficaram um tempo esperando a decisão do árbitro José Wright.

– Houve realmente uma manifestação do José Roberto Wright se iria ou não ter o jogo. O clima ficou muito tenso, todos preocupados com a saúde dos torcedores e ficamos um bom tempo parados em campo. Até o Wright, dá o início a partida. Mas todos os atletas preocupados e até porque são seres humanos. Ficou um clima bem chato – destacou.

O meia ainda lamentou o resultado do jogo e frisou que a equipe “não encaixou” naquela tarde em 1992. Apesar disso, parabenizou o time pela luta dentro de campo e postura em outros duelos.

– A equipe do Botafogo estavam acostumados com decisão. A verdade que não encaixou, não jogamos bem e não conseguimos o título tão sonhado. Me recordo muito bem. Mas sem querer menosprezar os adversários, o Botafogo jogava da mesma maneira, tanto em São Paulo, Minas, Porto Alegre, enfim.. Sempre querendo propor o jogo, a vitória a todo instante. Mas nesta partida, infelizmente, não deu nada certo – lamentou.

WRIGHT: “PODERIA HAVER CONFUSÃO NA RUA E SERIA MUITO DIFÍCIL DE SER CONTROLADO

Foto: Reprodução

O árbitro da partida José Roberto Wright contou ao Esporte News Mundo porque optou pela realização do jogo, mesmo diante do cenário em que se encontrava a arquibancada.

– Quando recebi a informação de que havia caído, era uma decisão que eu teria que fazer. Porque já tinha menos de 3 horas para o início da partida. O regulamente naquela ocasião dizia que até 3 horas poderia ter interferência da federação e organização do jogo. Após este momento, só o árbitro poderia decidir. Então, chamei o chefe de policiamento e perguntei se ele poderia dá segurança no local, onde caiu a grade. E ele disse que sem problema, como de fato fez – disse.

Wright frisou que se tivesse cancelado ou adiado a partida poderia acontecer uma confusão generalizada entre os torcedores. Além disso, vibrou que nada mais de grave aconteceu durante o jogo.

– Por que manter a partida? Você imagina a quantidade de pessoas e as torcidas organizadas, desorganizadas melhor dizendo, poderia haver uma briga muito grande, confusão na rua e seria muito difícil de ser controlado. Já que tinha a garantida polícia em fazer a segurança no local, pude realizar a partida. Felizmente, ocorreu tudo bem. Mas infelizmente pela fatalidade, fiquei muito preocupado com isso – afirmou.

Aos 75 anos, o ex-árbitro de futebol afirmou também que os jogadores não foram tão afetados em campo, apesar de no início do duelo estarem tensos e frisou que ao longo da partida os ânimos foram se acalmando em relação ao acontecimento.

– Não teve nada de confusão não. Os jogadores sentiram, claro, mas como eles não viram, estavam dentro do vestiário, não foram tão afetados. Foi bem tranquilo e não teve qualquer problema dentro de campo – concluiu.

TORCEDORES “IN LOCO”

Foto: Alexandre Vidal/Flamengo e Thiago Ribeiro/Botafogo

Um dos torcedores do Flamengo, que estava na arquibancada e viu toda a situação, poderia ser um dos envolvidos no caso. O advogado Alexandre Bandeira de Mello, como um torcedor tradicional, sempre costumava a ficar atrás gol, onde caiu a grade. No entanto, um atraso mudou o rumo:

– Sempre ficava na época atrás do gol, onde caiu a mureta. Mas nesse dia eu e meu amigo atrasamos muito para chegar no jogo e quando chegamos estava tudo lotado. Com isso, ficamos no meio da arquibancada no meio-campo mais para o lado da torcida do Botafogo, bem de frente para o que aconteceu. Na hora, estava acontecendo uma preliminar de master e tinha uma falta perto da área do adversário e todos olhavam para aquela direção. E quando desabou todo mundo se olhando não entendendo nada do que estava acontecendo, os jogadores em campo olhando, desesperados. E a torcida do Botafogo cantando loucamente, vibrando como se tivesse sido um gol – disse antes de complementar.

– A gente chegou tarde, justamente, porque meu amigo Jeferson disse: “é jogo de torcida única, podemos ir com mais tranquilidade hoje”. Mas por acaso foi a sorte. Não ficamos justamente onde teve o problema. Inacreditável – complementou.

Alexandre destacou que a preliminar que estava ocorrendo no momento foi paralisada na hora. Após isso, relembrou que o início do duelo não foi nada agradável e ficou impressionado como aconteceu.

– Parou tudo, acabou na hora. Os jogadores começaram a andar em direção do acontecido e não teve mais nada. Depois, foi aquela correria de bombeiro para tentar segurar quem estava ferido e o jogo começou depois… O jogo foi horrível. É impressionante que parecia um montinho de areia caindo. Foi impressionante!

O advogado ainda relembrou um momento ruim por parte da torcida do Botafogo, que vibrou após a queda da grade. E ressaltou que a comemoração do pentacampeonato foi tranquila, mas não do jeito que se imaginava.

– Você imagina, na arquibancada tinha ali 1/4 de botafoguense e 3/4 de flamenguista. No começo do jogo, a torcida do Flamengo ficou calada, apreensiva. Mas a torcida do Botafogo gritando “eu, eu, eu flamenguista se fu…”. Inacreditável. Detalhe: eles tinham perdido por 3 a 0 no primeiro jogo, eles estavam com uma desvantagem terrível. E quando o Flamengo abre o placar, com o Júnior, a torcida ficou mais tranquila. E lá na área onde teve o acidente, eles tiveram que improvisar um isolamento, mas o medo era que o pessoal caísse em uma comemoração. Mas quando o Flamengo fez 2 a 0, Botafogo chegou a empatar… Depois, a comemoração foi tranquilo, não do jeito que se imaginava. Seria diferente se não tivesse acontecido esse acidente. Muito louco! – concluiu.

Pelo lado alvinegro, um torcedor que na época tinha apenas 9 anos, se lembra e muito bem da situação. O jornalista Kadu Macri relembrou do momento após a queda da grade, com muita correria e desespero.

– Normalmente eu ia nos jogos com o meu pai. E ele sempre costumava a chegar sempre atrasado nas partidas, não tinha muita folga. A gente chegou e faltava 10 ou 15 minutos para o jogo começar e já tinha acontecido a queda da arquibancada e eu lembro que quando estávamos subindo a rampa tinha muita gente desesperada, muita ambulância, barulho. Não cheguei a ver a queda da arquibancada, mas vi todo o cenário de transtorno. Fiquei muito assustado – frisou.

– Tinha gente ensanguentada, chorando. Na hora, eu não tive essa dimensão. Quando cheguei o setor da arquibancada estava com proteção e embaixo as pessoas limpando, tirando sangue. Lembro lances do jogo, mas nada muito detalhado. Só sei que tinha acontecido algo grave. Só tive a dimensão da situação quando cheguei em casa. Minha mãe desesperada, porque só tinha escutado que havia caído parte da arquibancada, mas não sabia ao certo até porque naquela época não tinha celular, internet. Quando chegamos em casa, ela ficou mais calma.

Quando chegou em casa, Kadu tomou ciência do que aconteceu. O pai do torcedor mirim não quis rever – até porque estava triste com o resultado da partida.

– Meu pai não estava querendo ver muita coisa relacionada ao jogo por conta da frustração da derrota. Eu cheguei a ver os jornalistas falando que tinha centenas de feridos e até mortos. Em casa que minha ficha caiu. Na época, eu nunca tinha visto uma tragédia, tanto policial, ambulância, bombeiro. Foi um baque mais nesse sentido.

O corretor de imóveis, Petrônio, também passou por algumas condições adversas antes de ver o caos instalado. Ele contou que não tinha ingresso e fez de tudo para entrar no estádio para ver a partida e ressaltou que foi um dos jogos memoráveis de sua vida.

– Fui no primeiro jogo e também no segundo. Na segunda partida, meu pai disse para eu não ir ao jogo. Mas eu, integrante da torcida jovem do Botafogo, entrei em 1988. No momento que coloquei a camisa na cintura, chegando no Maracanã, vi aquele mar vermelho e preto. Era muita gente e não tinha como comprar ingresso. Fui em um cambista e quando entrei eu não acreditei. A torcida do Flamengo tinha tomado de ponta a ponta. A gente tinha uma rivalidade, com a Jovem do Flamengo e eles queriam invadir o nosso lado, mas conseguimos sustentar. E de repente, a arquibancada caiu. Deus que me perdoe, hoje até me arrependo, quando caiu eu cheguei a comemorar. A gente estava no trauma, no primeiro jogo perdemos de 3 a 0, todo perrengue com os caras. O negócio foi sério! A partida terminou 2 a 2 e para ter uma ideia, quando estava 2 a 1, eu fui embora. Aquele dia tinha 120 mil, no mínimo, no Maracanã.

Essas foi uma das histórias do duelo e que entrar para a história do estádio, marcado por jogadores, torcedores e árbitro. O Esporte News Mundo está com uma série de reportagens especiais sobre os 70 anos do Maracanã. Ao longo dos dias, o site relembrar os principais acontecimentos marcados na história do estádio.

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