Muita gente lembra da final da Copa João Havelange em 2000 entre Vasco e São Caetano não pelo gols, ou pela beleza do jogo, mas pelo extracampo envolvendo a queda de um alambrado em São Januário, e até pelo inusitado patrocínio do SBT estampado no uniforme do Cruz-maltino – justamente em uma partida de direitos de transmissão exclusiva da Rede Globo.
Bom, o problema com o alambrado é sempre difícil prever neste país, mas o conflito de patrocínios pode voltar… E outras situações “estranhas” também.
O motivo? A edição da Medida Provisória nº 984, assinada pelo presidente Jair Bolsonaro na última quinta-feira, e o avanço do Projeto de Lei nº 1013/20 – duas bizarrices jurídicas que envolvem o nosso futebol. Ou melhor, que tentam torná-lo, sob o subterfúgio da pandemia ocasionada pela Covid-19, um cenário menos transparente e mais propício ingerências.
O Projeto de Lei dá aos clubes uma folga de sete meses para a divulgação de suas demonstrações financeiras e também trata de forma afagável sobre as punições dos dirigentes que sejam eventualmente punidos por descumprirem normas de transparência financeira das confederações. Ou seja, a “boa”, velha e nebulosa gestão de clubes ganha reforço.
Ao que tange a MP, a história também não muda. Sem nenhuma urgência, assunto relevante ou de interesse coletivo (requisitos para a edição de uma medida provisória), o instrumento muda a Lei Pelé em diversos pontos, permitindo agora que basta o clube mandante vender os direitos de transmissão para a emissora para que haja a divulgação televisiva, não importando se o outro clube realizou acordo ou não com a empresa (antes os dois precisariam anuir com a mesma emissora).
A medida também permite que produtoras/emissoras possam patrocinar equipes esportivas, o que antes era proibido justamente por causa do enigmático caso entre SBT e Vasco.
Agora como fica? Virou festa? Resposta: mais ou menos.
Toda medida provisória é encaminhada para as casas legislativas (Câmara e Senado) onde pode ser modificada ou ser totalmente tornada ineficaz. E todo projeto de lei também pode ser modificado com o tempo e, ao final, ser vetado pelo Presidente da República. Também existe a possibilidade de questionamento judicial dessas normas. Ou seja, nada certo ainda.
Mas se tudo correr normalmente, e tais instrumentos tiverem sua vigência aprovada, coisas estranhas voltarão ao futebol, no sentido em que, em pleno século XXI, se torna totalmente alheio/estranho/alienígena às boas práticas de gestão esportiva um futebol brasileiro que permite a falta de transparência, a confusão na cessão dos direitos de transmissão de jogos e outras medidas nada urgentes e nada relevantes para o cenário esportivo brasileiro.
*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Esporte News Mundo