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De pai para filha: Cruzeiro se tornou a paixão de Cinthia ao ouvir o pai gritar seu amor pelo clube

Cinthia e Otacílio sempre acompanham os jogos do Cruzeiro junto. Ele com o inseparável radinho e o amor pela Raposa, e ela com o amor pelo pai e pelo clube Foto: André Araújo/Cruzeiro

Dizem que amor se sente e, em muitos casos, não se pode ver ou expressar tamanho sentimento. De fato, a paixão pelo Cruzeiro na família de Otacílio Aires começou assim: pelo sentir. Cego desde os seis anos de idade, o auxiliar de apoio à saúde, de 61 anos, chegou a Belo Horizonte, aos 14 anos de idade, já com o time celeste no coração. Apesar de não conseguir enxergar as cores do clube, Otacílio sabe muito bem que a Raposa é a sua paixão.

Mas, se engana quem pensa que Otacílio não expressa esse sentimento em palavras e emoções. Não à toa, o legado celeste foi passado à sua filha, Cinthia Aires, de 24 anos, pelos gritos de “Cruzeiro, Cruzeiro!”. Uma paixão, literalmente, vinda de berço.

— Minha filha, filha de mãe atleticana, virou cruzeirense de tanto eu gritar na orelha dela, desde bebezinha. Às vezes eu começava a gritar ‘Cruzeiro’, ia vê-la e ela estava lá batendo os pezinhos no berço. E aí virou cruzeirense que nem o pai, e acho que até mais, porque ela sofre pior que eu, mas a gente vai calejando com o tempo também. O tempo vai fazendo a gente aprender —, conta Otacílio.

A primeira lembrança de Cinthia é um pouco diferente, mas ainda dentro do berço, aos dois anos de idade, em um jogo do Cruzeiro com o seu maior rival, o Atlético-MG. A mãe de Cinthia, já falecida, talvez não tenha gostado nada do que viu, mas Otacílio, com certeza, sentiu a alegria do momento em seu peito. Seu legado havia alcançado a próxima geração de sua família.

— Meu pai sempre foi um cruzeirense chato, literalmente aqueles cruzeirenses chatos, que hoje eu me considero também. Então, quando eu era bebê, em todo jogo, ele gritava, cantava e ficava aquela zoeira toda. E aí, teve um dia, em um clássico, um Cruzeiro e Atlético, eu estava no berço e começou o jogo, eu comecei a gritar “Zêro” e foi isso, desde dois anos de idade —, relata a produtora de vendas Cinthia, filha de Otacílio.

Do berço para as arquibancadas

Cinthia se tornou companheira de jogo de Otacílio. Em diversas oportunidades, os dois, juntos, acompanharam e viram o Cruzeiro jogar. No estádio, a presença de Cinthia é, também, uma forma de ajuda, já que devido a deficiência ocular, Otacílio se depara, frequentemente, com os desafios de locomoção.

Mas, as dificuldades, para ele, valem a pena, e até mesmo param por aí, pois o pai de Cinthia não deixa a falta de visão lhe atrapalhar a torcer pelo seu Cruzeiro. E, além de sua filha, o fone e o radinho se tornaram companheiros inseparáveis.

— Sempre que eu vou ao estádio, tenho que ter companhia para poder deslocar de um lado para o outro. Quase sempre estou com a minha filha, e quando chego lá, ligo meu radinho, coloco o fone no ouvido e fico ouvindo a narração dos locutores. E eu vivo muito isso, porque eu gosto de gritar, gosto de pular, sempre com o meu Cruzeiro no coração. E é muita emoção ficar ouvindo os locutores junto com a torcida. É muito empolgante —, diz Otacílio.

Foi esse amor que, segundo relatos de Cinthia, a tornou a torcedora fanática que é, sempre acompanhando o Cruzeiro, seja das arquibancadas ou de um bar, em jogos fora de casa. E entre vitórias, conquistas e decepções, a filha de Otacílio conta que o jogo mais marcante em que ambos assistiram juntos foi o entre Cruzeiro e Flamengo, pelo Campeonato Brasileiro de 2019. Uma partida que acabou em derrota para a Raposa e a adrenalina maior foi vivida pelos torcedores, e não pelos lances dentro das quatro linhas.

— Naquele jogo, teve uma pancadaria e tivemos que correr para ir embora, com aquele medo de alguém o machucar ou realmente acontecer alguma coisa por meu pai ser cego. Foi uma loucura para poder ir embora. Acho que foi o jogo mais emocionante, no quesito adrenalina.

Outra história, que marcou Cinthia, foi em um jogo, que apesar de ela não recordar o adversário, nem o motivo da partida, a memória do momento vivido com seu pai ficou intacta. O que marcou: o radinho e o amor de seu pai pelo Cruzeiro.

— A gente foi assistir um jogo no bar, não lembro qual jogo era, mas era fora, e aí ele com o radinho e a gente assistindo televisão. E aí acabou que o Cruzeiro fez uns gols e o pessoal ficou bravo com ele, porque ele começa a gritar muito quando o Cruzeiro faz gol, e tem aquele delay entre TV e rádio. Foi a maior loucura, porque o pessoal queria xingar, mas foi bem engraçado também. E é uma coisa que eu fico feliz, muito feliz mesmo, porque é uma paixão sem igual, é um sentimento inexplicável, que se tornou meu. O amor que ele sente pelo Cruzeiro, me levou a ser a cruzeirense fanática que eu sou hoje.

Orgulho

Em uma palavra, Cinthia descreveu o pai e o time do coração: orgulho. Um sentimento que surgiu pelo que o pai representa para ela, mas também pelas superações e paixão pelo clube, um amor dividido por eles.

— Tenho muito orgulho do meu pai, de tudo que ele é e representa para mim e de tudo que ele passou e passa na vida dele, tudo que ele faz, a forma como os outros vêm ele, e o Cruzeiro é um time que, mesmo com todos os seus contratempos, como qualquer outro time, me dá muita alegria —, descreve Cinthia.

Um orgulho que viralizou nas redes sociais. Em uma postagem de Cinthia, em seu perfil no Twitter, o amor foi que ela sente foi declarado ao pai, ao Cruzeiro e ao legado deixado por ele. A publicação chegou até o próprio Cruzeiro, que além de mandar um recado para Otacílio, o visitou.

— Eu fiquei muito feliz de a equipe do Cruzeiro vir aqui em casa, fiquei extremamente feliz pelo o que o clube fez para com a minha pessoa —, diz Otacílio.

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