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Gilberto Silva relembra momentos no Galo e Coelho, e se diz neutro na final do Mineiro: ‘Fazem parte da minha vida’

Gilberto Silva relembra momentos no Galo e Coelho se diz neutro na final do Mineiro: 'Fazem parte da minha vida'
CBF/Divulgação

No próximo sábado (22), Atlético e América entram em campo para a disputa do título estadual. A história do Galo e do Coelho se cruzam há muito tempo. Além de serem conhecidas por revelarem atletas, muitos se destacaram no mundo afora, alguns, inclusive, fizeram parte do elenco das duas equipes. Um exemplo é o ex-volante Gilberto Silva.

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Cria da categoria de base do América, o ex-jogador deixou o alviverde e foi para o Atlético logo na sequência. Quando ainda atuava no Galo, conquistou o Pentacampeonato Mundial com a Seleção Brasileira. O volante foi titular da Seleção Canarinho durante quase 10 anos, participou de três Copas do Mundo, chegou a vestir a braçadeira de capitão da Amarelinha e também foi o primeiro brasileiro da história a conquistar o Campeonato Inglês, pelo Arsenal, e ficou conhecido como Muralha Invisível. Voltou ao futebol do Brasil em 2011, passou pelo Grêmio e retornou ao alvinegro em 2013.

De família humilde, Gilberto Silva é o mais velho de quatro filhos. O primeiro contato com o América foi, aos 12 anos, na base. Após a aposentadoria do pai e problemas de saúde da mãe, precisou voltar para casa e sair do alviverde. Para ajudar a família, trabalhou como servente de pedreiro e depois em uma fábrica de doces em sua terra natal Lagoa da Prata, Minas Gerais. Quatro anos depois, retornou ao clube e assinou o seu primeiro contrato profissional.

Com um currículo extenso, uma história de superação e várias conquistas, Gilberto Silva concedeu uma entrevista exclusiva ao ENM e relembrou os momentos que viveu no América e no Atlético. Também comentou sobre a relação com as duas equipes e falou sobre seus projetos atuais.

ENM: Gilberto, como é para você relembrar esses momentos do início da sua carreira? Desde os momentos na Vila Luciânia, na fábrica de doces, a chegada ao América, depois Atlético-MG, o Pentacampeonato Mundial com a Seleção, até ser ídolo também do Arsenal, a Muralha Invisível.

Gilberto Silva : – Lembrar de tudo que eu vivi antes do futebol é algo emocionante para mim, desde a Vila Luciânia, da fábrica de doces à chegada no América. Houve algumas outras coisas antes. Eu fui também servente de pedreiro, enfim, é super emocionante porque, talvez, foram situações quase improváveis na vida de um sonhador, né? Alguém que jogou futebol desde criança e sempre sonhou em ter essa oportunidade no futebol. No meu caso, tudo aconteceu muito diferente porque eu não tive tanto tempo de categoria de base. No meu primeiro contato, desde o teste no Atlético, onde eu fui reprovado, depois fui para o América e passei. Depois de cinco meses, voltei para minha cidade para trabalhar na fábrica de doces e, então, retornei novamente ao América e tive uma carreira de sucesso. É algo emocionante. É inacreditável, porque, da forma como aconteceu, foi muito difícil.  Eu sou extremamente feliz, orgulhoso da forma como tudo aconteceu, por ter alcançado os meus objetivos no futebol, mesmo diante de algumas frustrações iniciais, ter atingido um ponto que eu jamais imaginava chegar um dia.

ENM: Conte um pouco dessas dificuldades antes da chegada ao América.
Gilberto Silva: – Antes de chegar no América, minha vida era super sossegada em Lagoa da Prata. Um menino, que jogava futebol nas escolinhas daqui e depois nos times amadores. Era estudante como vários outros da minha idade. Nós tivemos algumas dificuldades, a minha mãe teve que se submeter a um transplante de rins; na época, eu trabalhava como servente de pedreiro e devia ter uns treze para quatorze anos. Jogava no futebol amador, tinha uma vida normal até surgir as oportunidades do América. Enfim, penso que uma das dificuldades maiores que a gente viveu como família foi esse momento delicado com a saúde da minha mãe.  Ela teve que fazer o transplante em 91/92. Eu trabalhava como servente de pedreiro, aí minha mãe fez esse transplante e, graças a Deus, correu tudo bem. Minha mãe, graças a Deus, é viva até hoje, se recuperou, está aí forte, saudável. Então, algumas dificuldades assim e de resto era a vida normal, de pessoas que trabalhavam para ganhar a vida honestamente, ajudar a família, já que eu tenho três irmãos mais novos do que eu, nada diferente de muitas outras pessoas, né, que dão duro na vida diariamente.  

No América, você chegou a conquistar junto à equipe o Campeonato Brasileiro – Série B: 1997, conquistou o acesso à Série A. Esse ano, o clube está novamente na elite do campeonato nacional. Como foi para você a conquista daquele título?

– Em 97, quando o América conquistou o acesso à série A, foi muito bacana, muito importante para o clube e para mim também. Um iniciante ali no profissional com o Givanildo (técnico do Coelho na época). Eu tinha retornado ao América em 96, depois de ter passado dois anos e meio trabalhando numa fábrica de caramelo na minha cidade (Lagoa da Prata). Em 96, eu retorno para o Juniores, um ano depois eu estava jogando a série B. Não era titular, mas entrei em vários jogos e conquistei junto ao América o acesso e o título. Foi algo muito emocionante, algo inesperado, as coisas começaram a acontecer muito rápido na minha vida. A partir daí foi uma sequência de coisas positivas, de crescimento profissional e pessoal, tudo muito rápido também. Eu fui abraçando tudo, aproveitando a oportunidade e foi assim que as coisas caminharam nessa época.


Foto: Acervo Coelho

Você tem acompanhado o Coelho? O que você acha do trabalho do técnico Lisca e do elenco atual do América?
– Eu tenho acompanhado bastante, está muito bacana o trabalho que vem sendo desenvolvido no clube, não só dentro de campo como também fora, com a reestruturação do clube. O Lisca tem feito um bom trabalho. Ele conseguiu dar um equilíbrio muito grande na parte técnica e de resultados para o América, e a equipe tem se mantido estável dentro de campo. Eu torço e sempre torci para o América. Desde que eu saí do clube, continuei acompanhando o América e torço para que ele consiga se estabilizar na série A. Sem dúvida alguma, a permanência do clube traz muitos benefícios e um crescimento importante que o clube precisa há muito tempo. Espero que esse ano a América consiga fazer um belo campeonato, um belíssimo trabalho. Aproveito e desejo sucesso a todos.

Quando ainda estava no América, você chegou a ser disputado pelo Cruzeiro e Atlético-MG. Teve um pré-contrato com a Raposa, mas acabou assinando com o Galo. Como foi aquele processo?

– Realmente houve uma questão entre a Atlético e Cruzeiro. Isso foi no final de 99, início de 2000, eu tinha um empresário que entrou em contato comigo, falando que o Cruzeiro estava interessado em mim. Na época, essa era a única coisa que eu tinha de informação e eu falei: “claro, me interessa sim”.  Já estava tudo praticamente acertado com o Cruzeiro e aí surgiu o Atlético. Junto ao América, eles me chamaram e me explicaram a situação, e que o América não ia negociar com o Cruzeiro porque ele tinha negado uma possível contratação anterior a essas abordagens que me fizeram e, então, estavam negociando com o Atlético. Então eu acabei voltando atrás e assinando minha rescisão com o América porque o contrato terminava em fevereiro de 2000, e acabei assinando contrato com o Atlético. Foi assim que começou a minha história um pouco conturbada no Atlético. Devido a essa disputa, o caso acabou indo para justiça, mas no final eu acabei indo para o Atlético, tive uma belíssima carreira e me deu condições de chegar à Seleção Brasileira.


Naquele ano, o presidente do Atlético era o Alexandre Kalil, o que ele te disse antes da contratação?
– Quando eu sentei com ele e a diretoria do América, na época, ele simplesmente virou pra mim e disse que se eu não jogasse no Atlético, eu não jogaria em mais nenhum lugar. Eu senti, obviamente, um jovem, intimidado, né?  Mas o que me fez assinar com o Atlético não foi essa forma como ele falou comigo naquele momento. Foi intimidante, mas não senti que eu tinha realmente uma obrigação, mas foi por acreditar nas pessoas do América, no que eles estavam me falando, na forma como as coisas aconteceram nesse período. Então, eu acabei mudando de opinião, fui para o Atlético e, enfim, foi tudo muito bem, apesar das dificuldades iniciais, que é normal. Depois as coisas foram se ajustando e eu consegui dar sequência na minha carreira.

Como foi retornar ao clube em 2012, conquistar o estadual e depois o título da Libertadores?
-Foi algo fantástico, né? Tive a oportunidade de conquistar o campeonato estadual, Copa Libertadores, fazer parte do maior título da história do clube é algo que não tem preço pra nenhum jogador. É algo maravilhoso, eu sou muito grato de ter tido essa oportunidade de ter retornado ao clube, mesmo não tendo sido um jogador titular. Mas valeu a pena cada dia vivido ali dentro, cada minuto do ano de 2013. Foi um ano inesquecível, marcante não só para todos os jogadores, como também para a parte técnica e todos os atleticanos.

Bruno Cantini/Atlético 

Qual foi o momento mais especial que você viveu no América e no Atlético e o mais difícil?
– Retornar ao América em 96 e primeira vez que eu cheguei no clube para fazer teste. Começa por aí, depois retornar após ter ficado dois anos e meio trabalhando no interior para ajudar a família. Foi algo marcante e importante, porque se eu não tivesse sido acolhido de volta, talvez não tivesse existido o Gilberto Silva. Teria sido o Beto de Lagoa da Prata que um dia jogou no América, provavelmente seria isso que teria acontecido comigo. Aí vem a conquista da série B, o acesso, até o último dia que eu joguei no América. Fui muito feliz nesse período. O América é o clube que me formou e tenho um carinho especial.
– No Atlético tive momentos vários momentos importantes. Em 2000, ele foi campeão mineiro, eu participei da campanha, jogamos a Copa Libertadores, não tivemos o êxito de 2013, mas através do clube eu tive a possibilidade de chegar à Seleção Brasileira, jogar a Copa do Mundo e a partir daí ganhar o mundo. Passei momentos, principalmente no Atlético, com lesão. Tive uma fratura de estresse, na época foi até sugerida uma cirurgia, mas acabei optando por não fazer, recuperei e dei sequência na minha carreira. Então, acho que os momentos sempre mais complexos para um jogador de futebol são as lesões. Para mim, esse período que eu estive no Atlético, de 2000 a 2002, foram delicados.

Como é sua relação com as duas equipes?
– Hoje no América eu tenho um acesso melhor às pessoas que gerem o clube. No Atlético as pessoas mudaram também, algumas eu não tenho acesso.  Na antiga diretoria, tinha uma pessoa lá dentro que, volta e meia, falava bobagem com o meu nome, principalmente depois que eu saí  do Atlético, onde existiu um processo na justiça que é público. Esse advogado, volta e meia, enquanto esteve lá na gestão anterior, falava bobagem a meu respeito na imprensa. Sempre gostava de contar uma gracinha, mas não falava realmente a verdade dos fatos e do porquê de tudo aquilo, mas para mim, é um caso mais que superado. Na atual gestão, ainda não tenho contato com as pessoas do clube.  
Enfim, tanto o América quanto o Atlético são clubes que eu vou guardar para a vida inteira no coração. Torço para as duas equipes mesmo nessa final do Campeonato Mineiro, todos têm o meu carinho especial. São duas equipes que fazem parte da minha vida, da minha história. Sou grato às duas equipes e aos torcedores que sempre me acolheram.

Atualmente, você é diretor executivo da Partner Sports, gerenciando a carreira de atletas profissionais de futebol, e é embaixador do Arsenal FC, FIFA e da Street Child United. Gostaria que você contasse um pouco desse momento da sua carreira e sobre seus projetos.

– Eu cuido da carreira de alguns atletas, tenho alguns jogadores de base no América, Atlético, Cruzeiro e também outras equipes. Tem sido um aprendizado gigante hoje poder auxiliar esses atletas e ajudá-los no crescimento da carreira e atingir os seus objetivos. Além disso, ao mesmo tempo, ser embaixador do Arsenal e ter uma continuidade na relação num clube onde eu joguei seis anos, também sou embaixador da FIFA, do Street Child United, que é um projeto social que cuida de crianças e utiliza o futebol como ferramenta de inclusão É superbacana cada projeto, atuo de forma diferente, tenho um conceito diferente e próprio. Isso me dá grandes oportunidades de aprendizado.
julia Cesar, Gilberto Silva
Júlio Cesar, Roberto Carlos e Gilberto Silva cerimônia “The Best”. Fifa/Divulgação

Qual mensagem você deixa para os jovens talentos do futebol que sonham em jogar profissionalmente? 
– O que eu tenho a dizer para os jovens talentos do futebol é que façam boas escolhas na vida. Escolhas de referência profissional, de pessoas que realmente são referências, às vezes as referências estão próximas da gente ou dentro de casa, bons colegas.  Nem sempre vai ser aquele treinador que é o bonzinho que vai ser a melhor referência, mas aquele que vai nos ensinar mais, ele é duro, mas é mais a gente vai aprender. Além disso, estudem para poder jogar melhor o futebol, ter uma compreensão melhor do futebol, da tática do futebol. Quando você consegue ter um desenvolvimento cognitivo na parte intelectual, isso você consegue transferir com mais facilidade para dentro de campo e compreender melhor. É isso o que foi passado pelos treinadores. Então, estudem, trabalhem bastante, trabalhem duro, porque a vida de jogador de futebol para quem quer seguir essa carreira e ter uma carreira de sucesso é uma vida dura, não é fácil. É importante dedicar, focar, ter paciência, resiliência e muito trabalho. Para aqueles que querem seguir esse caminho, eu desejo toda sorte do mundo.

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