Acompanhe um breve apanhado sobre a história dos games e a trajetória de uma indústria milionária, na primeira de três matérias que mostrarão como saímos de um ponto na tela para um esporte popular no mundo inteiro
Quando olhamos o atual cenário competitivo de esportes eletrônicos, com premiações exorbitantes, contratos com pro-players e toda uma imprensa emergente em torno de si, pode ser difícil olhar para trás e lembrar das origens. Cada vez menos gente se lembra do início dessa indústria e dos pioneiros que introduziram essa forma de entretenimento tão especial que marcou todas as gerações que vieram. Por essa razão, separamos alguns recortes que contam um pouco da história dos jogos digitais e das competições que mais tarde seriam conhecidas como e-Sports.
Os jogos, comercializados e distribuídos da forma que conhecemos hoje, não surgiram a partir de uma necessidade de criar um produto para uma demanda, na verdade muitas empresas apenas aderiram à produção e ao desenvolvimento dessas tecnologias à sua logística empresarial de muitos anos, depois de já consolidadas no mercado (Kirriemuir, 2006). A empresa Nintendo, por exemplo, que foi fundada no século XIX, produziu jogos de cartas por quase 80 anos antes de diversificar suas atividades para tecnologias eletrônicas. Assim como a Sony, antes chamada de Tokyo Telecommunications Laboratory, se tratava de uma empresa que trabalhava com produtos baseados em transistores, antes de se envolver com a produção e desenvolvimento de jogos.
Os primeiros jogos digitais da história
Pouca gente sabe, mas o primeiro jogo foi programado numa máquina que nem tinha a função de videogame.Tennis for Two foi desenvolvido em 1958 por um físico chamado William Higinbotham, do Laboratório de Brookhaven e rodava em um osciloscópio, um instrumento de medida que gerava gráficos bidimensionais. Um fato curioso é que o jogo não tinha nenhuma aplicabilidade prática no laboratório, surgiu apenas de uma necessidade antropológica do ser humano de se entreter. O jogo era basicamente uma representação de uma quadra de tênis vista de lado onde o jogador ajusta o ângulo de suas raquetadas com um botão rotativo e tenta acertar a bola sobre a rede pressionando outro botão no controlador. O jogo era uma grande atração no Laboratório, e por muito tempo levou diversos americanos a visitarem a instituição, para conhecer aquilo que as pessoas chamavam de “jogo digital”.
Quatro anos depois, no Instituto de Tecnologia de Massachussets (MIT), a mesma necessidade antropológica se manifestou em alguns alunos de doutorado e pesquisadores liderados por Steve Russel, um dos criadores da Atari. Utilizando um PDT-1, um grande computador de pesquisa que ocupava quase uma sala inteira, o grupo de pesquisadores programou o Spacewar!, primeiro jogo a ser replicado em outros computadores e reproduzido em outros institutos de pesquisa. Àquela altura, Steve Russel mostrou sua criação para seu amigo Nolan Bushell, que se apaixonou à primeira vista pelo jogo, e entrou com um investimento na criação de Russel para desenvolver o primeiro Arcade da empresa que mais tarde viria a se chamar “Atari”, primeira linha a ser vendida comercialmente, tendência que deu início aos primeiros fliperamas.
Apesar dos avanços feitos nas instituições científicas, a inserção dessa tecnologia no mercado aconteceu de maneira lenta, devido à falta de incentivos para o desenvolvimento de uma tecnologia que fosse acessível e que pudesse ser levada ao público. A década de 60 foi marcada por muitos jogos que, devido à falta de investimento, foram engavetados e não puderam ser comercializados. Como exemplo temos a simulação baseada numa transmissão de Hockey, desenvolvida em 1967 pela Sanders Associates.
Foi apenas em 1972 que o primeiro console doméstico, o Magnavox Odyssey de Ralph Baer, chegou ao mercado consumidor. O console vendeu mais de cem mil cópias em menos de um ano de lançamento, e, no mesmo ano, Nolan Bushel criou uma das mais conhecidas empresas do ramo de jogos digitais, a Atari. Uma das primeiras criações da Atari foi uma versão para console de Pong, uma simulação bem simplificada de um tênis de mesa, programação desenvolvida na década de 60.
A popularidade do jogo fez com que fosse copiado e distribuído por outras empresas, o que foi um marco do início da relação dos games com o sistema judiciário, já que Magnavox e Atari lutaram durante anos com questões de diretos autorais do jogo.
A popularidade dessas empresas, porém, foi diminuindo ao ponto em que seus jogos começaram a ficar ultrapassados em jogabilidade e recursos gráficos, na opinião de seu público. Essa questão foi agravada pelo lançamento de computadores mais acessíveis. Durante a década de 80, inúmeros avanços de hardware permitiram a criação de computadores com teclado para a entrada de dados que podiam ser armazenados em disquetes. Apesar desses computadores terem sido pensados para atuar em funções educativas ou de trabalho, grande parte acabou servindo também para a prática dos jogos. Muitos deles, inclusive, com capacidades e gráficos superiores aos dos consoles, gerando ainda mais descontentamento com as empresas de videogames.
A primeira fase da guerra de consoles
Em 1983, porém, a empresa japonesa Nintendo Co., antes produtora de jogos de carta, já passando pelo processo de mudar e desenvolver seus produtos, lançou seu primeiro console. Em julho, o chamado Famicom, abreviação de “Family Computer” (nos EUA chamado de “NES” – Nintendo Entertainment System), chegou ao mercado consumidor a um custo relativamente baixo em seu lançamento, gerando grande popularidade frente a uma indústria que estava se retraindo devido ao descontentamento do recente público gamer somados ao acesso crescente aos superiores computadores que além de rodarem melhores jogos, ainda exerciam outras funções.
Mesmo assim o NES foi um sucesso, em dois anos de mercado, a empresa vendeu mais de 60 milhões de cópias do console (NINTENDO, 2016), precisando ampliar sua capacidade industrial para suprir a demanda. Este momento pode ser considerado um marco, pois o início da década de 80 foi marcado pela predominância da Nintendo no mercado de jogos. No mesmo ano em que lançou o Famicom, a Nintendo foi cotada pela primeira vez na primeira sessão da bolsa de valores de Tóquio.
Outra empresa japonesa que batalhou junto à Nintendo, frente ao declínio da indústria, foi a SEGA. Em 1985, lançou o SEGA Master System, seguido do SEGA Genesis, em 1989. É interessante notar que as duas empresas mantinham uma rivalidade que, segundo a série documental GDLK (Netflix, 2020), com certeza reaqueceu a indústria e trouxe novos ares ao mercado. A entrada da SEGA no mercado de games marcou o início da chamada “Guerra dos Consoles”, que até hoje perdura, porém com diferentes empresas (Sony e Microsoft).
Enquanto a Nintendo desenvolveu seu primeiro Hand Gear (dispositivo móvel), o Game Boy, a SEGA fazia frente com seu dispositivo portátil Game Gear. Outro aspecto interessante dessa competição é a forte propaganda feita por ambas empresas acerca de seus personagens mais famosos. Pela SEGA, Sonic The Hegdehog, disputava o coração do público com Mario, de Super Mario Bros, título aclamado da Nintendo lançado originalmente para o NES e Famicom.
A Atari tentou acompanhar as outras empresas, e, em 1993, desenvolveu seu primeiro console 64-bits, o Jaguar. O produto, porém, não foi muito bem recebido devido ao seu alto custo, somado a pouca quantidade de material produzido para aquela mídia. Desde então a Atari se retirou do lado da produção de hardware da indústria dos games.
Nos dois anos seguintes, a SEGA lançou o Dreamcast e, em seguida, o Saturno 32-bits. Um marco muito importante para a história dos games, já que esses consoles foram anunciados sob a forte propaganda de que disponibilizariam acesso a jogos online. O Saturno e o Dreamcast, porém, tiveram um tempo de vida relativamente curto devido ao lançamento em 1994, do Playstation, pela Sony, mais tarde renomeado para PS One.
O console sonysta foi um sucesso de vendas que representou uma revolução nos videogames por conta dos seus baixos preços, tanto para os consoles, quanto para os jogos, que também eram produzidos por muitas empresas diferentes, possibilitando uma grande diversidade de jogos. Se comparado ao Dreamcast e ao Saturno, que só entregaram suas mais valiosas peças de marketing (jogos online) no final de sua existência, o Playstation acabou por ser a opção mais escolhida no período, o que marcou o fim para esses dois consoles.
A próxima empresa que entrou no cenário para modificar completamente as relações da indústria foi a Microsoft, com seu console Xbox. A entrada da empresa caracterizou a segunda fase da Guerra de Consoles, mas vamos falar mais disso amanhã!
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