O ano de 2020 foi atípico para o mundo inteiro. A pandemia causada pela Covid-19 tem infectado pessoas pelos quatro cantos do planeta e, só no Brasil, ceifou mais de 190 mil vidas. Algumas competições chegaram a ser canceladas e outras adiadas, como aconteceu com os Jogos Olímpicos de Tóquio. Campeonato Cearense, Copa do Nordeste e Copa do Brasil foram paralisadas. Nordestão foi o primeiro certame brasileiro a retornar. No entanto, no meio de tantos problemas, o Ceará foi um dos poucos clubes do País que soube se reinventar e encontrar outros meios para ter saldos positivos no meio de tanta turbulência.
Começo difícil com trocas no comando
Após a permanência do Ceará na elite nacional em 2019, a diretoria do Ceará optou por permanecer com Argel Fuchs no comando do time. Mesmo sem nenhuma vitória e com boa parte da torcida pedindo sua saída. No entanto, seu emprego em solo cearense já que seu time não apresentava um bom futebol e conquistou apenas uma vitória em cinco jogos disputados pelo Estadual e Copa do Nordeste. Em sua vaga, o retorno de Enderson Moreira que havia demitido durante a disputa da Série A do Campeonato Brasileiro após uma grande sequência de jogos sem vencer.
Ao todo, o mineiro esteve à frente da equipe 10 vezes e venceu seis. E era visível a evolução do grupo. No entanto, o Ceará fez sua última partida na vitória sobre o Sport, na Arena Castelão, pela Copa do Nordeste. Aquela partida, que até horas antes do jogo, era esperada que houvesse torcida, teve os portões fechados para o torcedor que já estava com sua entrada garantida, por decreto da Justiça, para prevenção de infecação em massa do novo coronavírus que, à essa altura, já havia tirado milhares de vida pelo mundo, principalmente na Europa.
E foi naquele 15 de março que Enderson Moreira comandou qualquer atividade do Vovô já que, logo após veio a paralisação de jogos e treinamentos presenciais, e três dias depois o treinador trocou o Ceará pelo Cruzeiro. Além da dificuldade em precisar manter o foco dos atletas, que estavam em suas casas cumprindo quarentena, com atividades de forma on-line, o clube também tinha uma dura missão: encontrar um bom técnico no meio de uma pandemia.
Início da “Era Guto”
Após muitos nomes sendo ventilados como possíveis substitutos de Enderson Moreira, o treinador que o Ceará anunciou foi Guto Ferreira. Terceiro treinador do time no ano – mesmo ainda estando no terceiro mês de 2020 -, Guto chegou sob desconfiança e críticas de parte da torcida mesmo após ter feito um belo trabalho no Sport-PE que, mesmo com muitas dívidas e salários atrasados, conquistou o acesso à Série A em 2019.
O novo treinador tinha a missão de conhecer os atletas e envolvê-los em um novo projeto. Tudo isso de forma on-line.
Muito trabalho, recomeço dos treinos presenciais no clube no dia 1º de junho, cumprimento de protocolo para evitar infecções e o retorno da Copa do Nordeste, disputada em Salvador. Com um início de trabalho, o time foi se ajustando aos poucos, aparecendo peças que logo se destacariam de forma individual, como Fernando Sobral e Vina, e a equipe venceu seis das oito partidas jogadas, inclusive as duas finais . Assim iniciava a “Era Guto Ferreira”: título da Copa do Nordeste com duas vitórias sobre o Bahia.
Enquanto os jogadores disputavam bravamento pelo bicampeonato regional na capital baiana, em solo cearense o marketing do clube trabalhava bastante e crescia em meio à crise causada pela Covid-19. Além da comemoração adiantada no aniversário de 106 anos do clube que contou com uma live de sucesso com banda de forró e venda da camisa Nação Alvinegra, escolhida em votação pela torcida, o clube foi pioneiro no “drive-in” onde os alvinegros tiveram a oportunidade de acompanhar as partidas do time no Nordestão. O evento aconteceu no estacionamento do Shopping Iguatemi, onde cada família ficava dentro de seus automóveis. Com queda de receitas e falta de bilheteria, o Vovô conseguiu se reinventar e contou com o apoio da massa alvinegra para manter o caixa em movimento.
Campeão invicto do Nordestão, finalista do Campeonato Cearense, chegou até às quartas na Copa do Brasil e entre os 10 primeiros colocados do Campeonato Brasileiro. Assim o Ceará de “Gordiola“, como é carinhosamente apelidado, fechou 2020. Mas nem tudo foi um “mar de flores”.
Tendo uma campanha de altos e baixos, o clube sofreu alguns reveses apresentando um futebol de pouca qualidade e criou uma pressão sobre o elenco com cobranças. A derrota por 3 a 0 para o Palmeiras, fora de casa pela Copa do Brasil, foi o estopim para a torcida fazer cobranças ao grupo na saída da delegação alvinegra do hotel para a Arena Castelão, antes do jogo da volta.
Sem o peso de outras competições para ter que dividir atenções e com o elenco quase todo à disposição, o time de Guto Ferreira voltou a evoluir e se postar melhor defensivamente, mais como ficou bem visto durante a Copa do Nordeste, e o Vovô foi galgando degraus maiores, apesar de alguns chamados “vacilos”.
Depois que caiu em 2011, o Ceará chegou a “bater na trave” pelo acesso algumas vezes, como 2012, 2013, 2014 e 2016. Mas, após uma campanha de crescimento, o acesso veio em 2017. Mesmo tendo a maior sequência de permanência na Série A entre os times cearenses – 2018, 2019 e 2020 -, as duas primeiras temporadas do time em seu retorno à elite nacional não foi muito de se comemorar. Em 2018, o time chegou a ser lanterna e ficar na zona de rebaixamente durante muitas rodadas. Já no ano passado, mesmo com um elenco que aparentava ter condições de ter ido além, a campanha foi medíocre e o Alvinegro só não terminou rebaixado porque o Cruzeiro teve uma campanha pior ainda. Mas 2020 era prometido que seria diferente.
Apostas altas, investimentos. Título do Nordestão no início do ano, vice-Estadual, bela campanha, por consequência, uma renda milionária na Copa do Brasil. No Brasileirão? É o time com a 10ª melhor campanha do campeonato. A sequência quase excelente de resultados contra adversários diretos – Vasco, Bahia, Atlético/GO, Fortaleza e Santos – onde venceu três, empatou uma e perdeu apenas uma, o deixou em uma situação ótima na tabela: apenas três pontos da classificação para à pré-Libertadores e a oito de distância do Z4.
A luta pela Liberta
Os números da equipe de Guto Ferreira são bem exatos no Brasileirão. São 27 jogos com nove empates, nove derrotas e nove vitórias. Apesar de ter feito 38 gols e ser o quinto melhor ataque da Série A – atrás somente de São Paulo (47), Flamengo e Atlético/MG (46), Internacional (41) e empatado com o Santos – o time sofre com altos e baixos defensivos e tem uma das defesas mais vazadas da competição com 37 gols sofridos.
Com saldo um de gol, o time sofre com algo chamando de “Vinadependência“. Artilheiro da temporada e líder de assistências, Vina é “o cara” do Vovô. A presença do meia faz toda diferente em campo, não apenas balançando as redes e dando passes, mas também quando se fala de postura. Quando o camisa 29 não está jogando, cai bruscamente o número de gols e vitórias. Isso é algo que Guto precisará trabalhar para mudar em 2021 já que o clube tem planos sérios de brigar por, pelo menos, uma Sul-Americana.
Segundo os cálculos com a atual campanha, as chances são de 77% enquanto para de rebaixamento é de apenas 1%, assim como também para à Libertadores.
E, por mais que 2020 tenha acabado, ainda não foi totalmente finalizado. O Brasileirão seguirá até fevereiro e, diferente de como começou a temporada, o Vovô vai muito bem na competição que disputa e com grandes sonhos para chegar à principal disputa do continente, ainda que as chances sejam remotas. Para isso, é preciso manter a regularidade na competição, melhorar o sistema defensivo e contar com o “secador” contra seus adversários diretos na parte de cima da tabela.