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Cruzeiro na Série B por mais um ano: o que deu errado?

Cruzeiro na Série B por mais um ano: o que deu errado?
Foto: Divulgação / Cruzeiro

Pela primeira vez na era dos pontos corridos, um time grande cai para a Segunda Divisão e não consegue subir no ano seguinte. Como se isso não bastasse, o Cruzeiro disputará a Série B em pleno ano do centenário. Em 2020, muito se falava dá má gestão anterior, que afundou o clube em dívidas e ocasionou em uma crise histórica dentro do futebol brasileiro. No entanto, hoje, em 2021, já surgem críticas e até pedido de saída dos atuais gestores, isso porque o planejamento feito visando o acesso à Série A passou longe de funcionar.

Sérgio Santos Rodrigues assumiu a presidência do Cruzeiro em maio deste ano para um mandato temporário e posteriormente foi eleito para o triênio 2020 a 2023, junto de Lidson Potsch Magalhães e Biagio Teodoro Peluso, que faleceu devido à complicações da Covid-19. Então, o presidente adotou o discurso de transparência, fazendo live todas as semanas para falar com o torcedor e propondo que, com ele, fosse feito um “novo Cruzeiro”.

Enquanto isso, dentro do futebol, o Cruzeiro nunca demonstrou algo novo. Desde antes mesmo da chegada de Sérgio Santos Rodrigues à presidência, o clube celeste fez uma das piores campanhas na sua história no Campeonato Mineiro em que ficou na quinta colocação e teve que disputar o Troféu Inconfidência, além de ter sido eliminado precocemente na Copa do Brasil pelo CRB. Nisso, o técnico Adilson Batista foi demitido em maio e foi contratado Enderson Moreira para o cargo.

Troca de treinadores

O Cruzeiro trocou de treinador quatro vezes durante a Série B, algo que comprometeu o rendimento dos jogadores em campo. Enderson Moreira não teve um bom rendimento, somando apenas o aproveitamento na série B e Copa do Brasil, foi de 33,3%. Então, foi contratado Ney Franco para assumir o cargo, que manteve o mesmo número de pontos conquistados.

Então, uma contratação bombástica aconteceu. Felipão aceitou assumir o cargo de treinador do Cruzeiro em outubro do ano passado, trazendo esperanças ao torcedor cruzeirense. Com Scolari, a Raposa teve uma sequência impressionante de sete jogos de invencibilidade, acendendo uma expectativa do time celeste finalmente pensar no acesso à Série A.

Mas, ao longo do tempo, o Cruzeiro foi tendo tropeços e a empolgação diminuindo. Felipão teve um desgaste a partir de problemas extracampo, de elenco e ainda, teve que ser o para-raios de jornalistas nas entrevistas coletivas após as partidas. Os resultados em campo pararam de aparecer e o aproveitamento com Scolari no comando da Raposa atualmente é de 54% e a chance de rebaixamento para a Série C é 0,056%.

Direção de futebol e montagem do elenco

O Cruzeiro em nenhum momento mostrou uma linhagem contínua de planejamento na montagem do elenco e comando técnico. Deivid começou com o cargo de diretor técnico e Ricardo Drubscky como diretor de futebol. O plantel montado para a temporada consistiu com contratações questionáveis e uma utilização confusa da categoria de base, subindo e descendo jogador do time Sub-20.

Quando Drubscky saiu, José Carlos Brunoro assumiu a direção do futebol. Com um bom relacionamento com Felipão e vasto currículo, o diretor foi bem avaliado quando contratado, mas com apenas dois meses de trabalho, ele seguiu para o Coritiba. Então, Deivid assumiu o cargo até janeiro deste ano.

Entrando nos problemas com o plantel do Cruzeiro, a constante troca na direção de futebol e no comando técnico, não houve um planejamento coeso durante a temporada. Para se ter ideia, o atacante Zé Eduardo, que estava emprestado ao América-RN, foi trazido de volta e foi muito pouco utilizado, mesmo renovando contrato com o jogador e aumentando seu salário. Outro nome de ataque, Matheus Índio, foi contratado e também e nunca foi relacionado para uma partida.

Somando todos os laterais-esquerdos utilizados pelo Cruzeiro na temporada, já são cinco. Dois deles, João Lucas e Rafael Santos, foram emprestados.

E ainda, transações como a troca da jovem promessa Maurício pelo atacante reserva do Internacional, William Pottker, e venda do jogador do time Sub-20, Caio Rosa para os Emirados Árabes foram feitas.

As decisões tomadas dentro do departamento de futebol celeste renderam prejuízos financeiros e dentro de campo. Para se ter ideia, até Felipão chegar, o Cruzeiro não havia entrado em campo com a mesma escalação titular em nenhuma oportunidade.

Outro dado importante, revelado por um perfil de scout e gerenciamento chamado BR Contracts, é que a folha reduziu R$ 4 milhões de 2019 para 2020. Em outubro de 2019, a folha era de R$ 7,6 milhões do elenco principal e hoje está na casa dos R$ 3,6 milhões. Esse número ultrapassa a folha de 12 times da Série A do Brasileirão.

Neste mês de janeiro, André Mazzuco foi contratado para o cargo de diretor de futebol com a missão de pegar o time cheio de problemas do Cruzeiro e montar um planejamento para a próxima temporada, além de convencer o técnico Felipão a continuar no cargo.

Atraso de salários e problemas extracampo

Afundado em uma grande crise financeira, o Cruzeiro passou por diversos problemas extracampo na temporada. O clube sofreu uma punição da FIFA de não poder inscrever novos jogadores, por conta de uma dívida referente à contratação de Wiliam Bigode com o Zorya FC, em 2014, mas que foi paga como promessa a Felipão, em outubro de 2020. No entanto, a Raposa foi impedido novamente de registrar atletas, dessa vez pela Câmara Nacional de Resoluções e Disputas (CNRD), agora devido a uma dívida com o PSTC da contratação do zagueiro Bruno Viana.

Além disso, o Cruzeiro deve dois salários e meio, além do 13º, aos jogadores. Os funcionários do clube também estão sem receber e até uma ‘vaquinha’ tem sido feita por alguns jogadores e cartolas para ajudar a manutenção desses trabalhadores. Fontes ligadas ao clube, ainda, afirmaram que a Toca da Raposa II teve a água cortada e foi preciso um caminhão pipa para transportar o recurso da Toca I para a Toca II.

Com a situação financeira caótica, os jogadores já fizeram um protesto antes da derrota para o Oeste, não se concentrando para a partida. O principal alvo disso tudo é o presidente Sérgio Santos Rodrigues, que prometeu manter os salários em dia, o que não tem sido cumprido.

Problemas como esse já fizeram que jogadores, como o volante Jadsom Silva, não se apresentassem para treinar e acionasse o clube na Justiça. Além disso, a falta de pagamento dos salários, impedimento de registrar atletas, e os demais problemas internos do clube, já geram uma instabilidade quanto a continuidade do trabalho de Felipão, que tem contrato até 2022.

Mau rendimento em casa

O Cruzeiro é o atual segundo pior mandante da Série B, ficando atrás apenas do lanterna do campeonato, Oeste. Em casa, a Raposa somou apenas 21 pontos em 51 disputados, dando em um aproveitamento de 41%.

Esse mau rendimento em casa comprometeu a disputa pelo acesso a Série A, já que os números como visitante são antagônicos com os de mandante. O Cruzeiro é o atual terceiro melhor jogando fora de seus domínios, com 29 pontos em 54 conquistados, dando em um aproveitamento de 53,7%, ficando atrás apenas do América e Chapecoense.

Se o Cruzeiro vencesse, pelo menos, mais quatro partidas em casa na Série B, estaria na briga pelo G-4. Nem se o time celeste tivesse aqueles seis pontos perdidos no início do campeonato por punição da CBF, ele estaria entre os quatro primeiros colocados.

Perspectiva

Dentro desse contexto, o Cruzeiro inicia o ano de seu centenário. Em um ano tão histórico do clube, a atual gestão terá de montar um planejamento totalmente diferente para a próxima temporada. Com mais um ano de receita de televisão de Série B, o clube mantém com um orçamento curto e não terá condições de manter um plantel inchado, com 33 jogadores.

Além do planejamento para o futebol, a gestão de Sérgio Santos Rodrigues terá de pensar em como viabilizar as finanças e capitalizar recursos em tempos de crise devido à pandemia da Covid-19, em que não se pode ter público nos estádios. Faltar com compromissos honrados por muito tempo pode gerar mais processos na Justiça, o que pode agravar ainda mais a situação financeira odo clube que mais deve no país, com uma dívida de cerca de R$ 2 bilhões.

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